LADRÕES

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Estou indo bem, estou com uma pasta cheia de trabalhos e tenho bastante dinheiro. Entro numa espécie de micro ônibus, uma lotação.

Um bandido entra logo depois. É um negro, parece o Forest Withtaker. É um bandido muito perigoso, apesar de tratar as pessoas com certa delicadeza e educação. Mas não pode ser desafiado (que nem o Forest num filme que eu vi).

Vejo que o medo de instala na lotação. O bandido começa a olhar a bolsa de um por um. Eu não estou com medo, estou aborrecida. Espero que esse bandido não me atrapalhe os planos, tenho que ir para onde eu estava indo e fazer o que eu estava fazendo. Não consigo lembrar se tenho ou não dinheiro na bolsa. Acho que não. Assim é melhor, não será roubado. Vou deixar o bandido vasculhar a bolsa, se ele achar dinheiro lá, que leve.

A Patrícia, uma amiga minha, me abraça e começa a cochichar no meu ouvido:

– Concentre-se. Você não pode irritar o bandido. Você vai conseguir. Repita comigo: Eu vou conseguir.

Eu estranho um pouco aquilo por que não me parece assim tão difícil não irritar o bandido. Eu não estava pretendendo brigar com ele, ou coisa parecida. Mas o tom dela é muito sério e me impressiona. Talvez ela saiba de alguma coisa que eu não sei e eu esteja correndo um risco maior do que penso. Repito com ela, baixinho: eu vou conseguir, eu vou conseguir.

O bandido vem olhar na minha bolsa. Eu procuro ser simpática e não atrapalhar.

Todo mundo está se esforçando para ser simpático com o bandido. Eu penso: bom, se a Patrícia não tivesse me impressionado, acho que deixaria ele olhar minha bolsa, mas não ia me esforçar para ser simpática.

O bandido acha meus trabalhos na minha bolsa. São desenhos, músicas, projetos. Começa se interessar por eles de maneira muito sincera. Fico até sentindo certa simpatia real por ele.

Depois estamos num lugar que parece minha casa número um, a da Vila Mariana. Uma garota, minha colega de trabalho, roubou descaradamente a minha idéia. Ela tinha me dito que minha idéia era boa, mas não era o que a equipe estava procurando, eu tinha desistido de mostrá-la e agora ela estava sentada na mesa de reunião, apresentando a minha idéia como se fosse dela e eles estavam gostando. Era uma idéia para uma campanha. Fico pensando que podia ir lá e interromper a reunião, mostrar minhas anotações e falar que ela tinha roubado minha idéia, mas me sinto em desvantagem para fazer isso.

Quem apresenta a idéia tem sempre a simpatia dos outros, por que correu o risco. Mesmo podendo provar que a idéia é minha, sinto que estarei em desvantagem por que não apresentei a idéia, e só me manifestei quando ela já estava sendo aceita.

A situação é complicada e vou procurar ajuda. Me ocorre pedir ajuda para o bandido. Ele demonstrou sensibilidade com meu trabalho, e é um homem que não se intimida. Resolvo contar meu caso para ele. Mas não vou deixar que machuque a minha colega traidora, só quero que ele me dê força para enfrentar as pessoas e lutar pela minha idéia. Mas o bandido passa meio de agarramento com uma garota, tentando seduzi-la. Ela é uma das passageiras da lotação. Fico pensando que ele não é tão amadurecido assim quanto eu pensava, ainda se deixa influenciar muito por desejo sexual e decido que ele não é a pessoa certa para me ajudar. Resolvo que vou falar com o dono da agência, um homem de uns 45 anos, de cabelos prateados. Ele é amadurecido e poderoso e é uma boa pessoa. Vou procurá-lo e expor todo meu caso para ele. Ele trabalha de guarda livros numa livraria, usando um jaleco branco. Vou até a livraria e começo a tentar localizá-lo.

{16 de novembro de 2003}

IMAGE CREDITS DENISA DVORAKOVA | PROCNE MAGAZINE FEBRUARY 2018

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