{19 de março de 2017}
Na ordem em que me lembro.
Moro numa casa com o Adriano. Parece ser fora de SP, mas não lembra Tiradentes.
É uma casa grande, mas feia. Desse tipo de casa que foi construída aos poucos, com puxadinhos, com zero cuidado estético, feita apenas para parar em pé.
Estou no quintal.
Há uma profunda sensação de realidade, no sentido de que nem lembro que me separei dele.
Parece que ficamos juntos desde sempre e.
E aqui é o ponto. Seria como se nossa vida juntos tivesse dado nisso.
Moramos nessa casa que é grande mas feia sem solução.
Há vários problemas na casa demandando melhorias e o Adriano,por mais que não seja nesse sonho mostrado com uma aura sinistra como em outros sonhos, meio que “empurra ”essas melhorias para mim, ou age como se eu quisesse fazer essas melhorias.
Eu, por outro lado, estou totalmente imersa na situação a ponto de nem mesmo ter uma visão critica da situação. Só depois isso vem.
O Adriano está me mostrando uns quartos que tem nos fundos, não como se eu morasse ali há pouco tempo, moro há anos ali com ele, mas como se não fosse muito nessa parte da casa. Num tom meio casual, mas com um toque muito muito sutil de depreciação, como se o subtexto fosse ” vc,que gosta tanto de ficar arrumando tudo, vai querer dar um jeito nisso aqui. ”
São dois quartos ali colados, que antes de olhar até poderia passar por interessante, mas quando vejo melhor, logo na entrada do maior deles, um galão grande de água foi simplesmente concretado no teto, deixando a boca do galão exposta para servir de caixa dágua.
Algo tosco, tosco, tosco, e o pior, quase impossível de reverter. Como vou arrebentar aquele concreto?
É assim que ele faz as coisas e aqui estou eu, vivendo no universo dele.
Uma série de pensamentos mais conscientes começa a romper aquela espécie de estado anestesiado e plácido em que me encontro.
Olho para o portão e o que me vem a cabeça é que os planos e expectativas do que poderíamos fazer juntos não vingaram, o tempo passou, a idade chegou, e foi isso que me restou, ou que nos restou, dar um jeito naquela construção horrível que é aquela casa, na qual, percebo, por mais que eu me dedique, jamais conseguirei deixar bonita.
Há um tom de velhice, de coisa vencida, que curiosamente não chega a ser deprê, não porquê não seja, pois é, mas sou eu que estou tão mergulhada na parte romântica daquele relacionamento, que não sinto o quanto é deprê. E o Adriano não é mostrado como mal ou culpado. Ele é daquele jeito.
E agora lembrei outro detalhe. Enquanto o Adriano se prolonga nas explicações e eu já estou com a cabeça nisso de que “ veja onde esse relacionamento desembocou ” e nem presto atenção nas explicações que ele dá por já ter me dado conta de que seria esforço inútil tentar melhorar aquilo, sai de um dos dois quartos uma aranha caranguejeira enorme.
Talvez uns 25 cm de diâmetro.
Ah, é nesse momento que grito por ele, pois ela meio que sobe em mim, no braço, mas logo cai no chão e segue.
Adriano não vem para me socorrer e eu me socorro sozinha, levitando ali.
Custa um grande esforço mas consigo. Segura a uns 50 cm do chão, começo a observar a aranha
E então percebo que a aranha virou um caranguejo do mesmo tamanho.
Fico olhando para aquilo com uma sensação estranha, que não chega a ser de repulsa .A aranha era assustadora, mas o caranguejo parece significar alguma coisa que não sei dizer o quê seria.
E então estou numa espécie de centro que tem um chão de concreto.
Não lembro muito como, acompanho a história de uma mulher, que também freqüentava aquele centro, não fica claro o que seria o centro.
Eu via essa mulher como se visse um filme, ela não estava lá, só as cenas com ela.
Ela era uma mulher de uns 40 talvez, totalmente sem graça, com ar dessas mulheres da Vila Madalena que parecem que procuram propositadamente acabar com qualquer traço de charme e feminilidade em sua pessoa.
Tinha um cabelo preto curto, claro, preso por uma faixa, uma cara branca amorfa e usava essas roupas brancas amorfas que esse tipo de mulher usa.
A narração dizia que essa mulher era meio uma escritora que tinha criado o “vid”. Oh deus, seria essa a palavra? Não posso garantir. Era uma palavra curta, com a letra “i”, que não tinha nem um som nem um sentido particularmente interessante ou belo.
No próprio sonho fico analisando a palavra tentando achar algo de bom nela mas me parece bem fraca.
Mas se for “ vid ”, claro que tem a ver com o vidme. Não sei.
Só sei que no sonho não enxergo nada que possa tornar essa palavra algo forte ou bacana. Combina com a mulher, algo meio amorfo.
Mas...i sso tudo é a minha opinião.A quela mulher, para o povinho Vila Madalena, era tudo de bacana e tal. Tipo essas coisas que eu vejo serem meio endeusadas na internet mas que acho bem sem nada de mais.
Essa mulher, no sonho, era uma escritora bem sucedida, como disse, tinha criado isso que ficou conhecido como “ vid ” ou coisa parecida, mas estava sob a pressão de algum forte conflito que no sonho parecia que estava claro qual seria,mas agora escrevendo vejo que não. Ela estava infeliz e agoniada, mesmo que aparentemente estivesse se dando bem em tudo.
Um narração que havia nessa parte ia explicando que ela freqüentava um tal clube Santos Dummont unidade II, pois haviam várias unidades em São Paulo, que era famoso por oferecer uma ampla gama de atividades artísticas-esportivas de alto, altíssimo nível.
A única coisa que para mim, para o meu ponto de vista, era realmente mega-bacana ali era o tal clube. Pois o nível deles era reconhecidamente muito acima do que seria o normal de um clube e as pessoas que praticassem as atividade nesse clube podiam de fato atingir um nível muito alto nas tais atividades.
O narrador vai citando as atividades : desenho, pintura, sei lá o quê, sei lá o quê, fala muito rápido para eu registrar, ainda mais que minha atenção está em memorizar o nome do tal clube, ao qual pretendo ir. Mas no fim da lista de atividades está, claro, balé, e nesse momento, sobre a vaga imagem do clube que flutua em miniatura ali ao lado da cena em que vejo a mulher com sua roupa branca pensando em suas aflições, surge a mesma mulher em miniatura, usando uma linda roupa de tule de bailarina, essa imagem sobreposta a imagem do clube.
Como se eu visse uma espécie de vídeo do YT sem computador.
A imagem da mulher em sua roupa de bailarina é sim, muito bela, tem em si toda a beleza e feminilidade e magia que falta à mulher, e há algo nisso que torna tudo muito patético. A explicação mais rasteira para a coisa seria de que a mulher tinha mil atividades fajutas e era infeliz, mas não era bem isso.
A mulher tinha, de fato, uma riqueza muito grande de atividade que eram verdadeiramente gratificantes e belas, havia vida e beleza nessas atividades, mas mesmo assim a mulher era infeliz. A narração não chega, acho, a dizer isso, mas é evidente pelo jeito dela.
Na hora que estou pensando essas coisas, a narração está citando um trecho do livro da mulher no qual ela dizia meio que ” a pessoa tem que ter atividades onde ela encontre vidozzah ”.
E acho que era a narração que acrescentava algo assim " ...mas depois ela tem que colocar os pés no chão bem firme ”.
A frase é exatamente essa, mesmo que eu não saiba se ela é uma citação exata de algo escrito pela mulher ou um comentário extra do narrador.
Mas o que penso nesse momento é :
– Então é isso que essa mulher realmente fez, ela criou esses nomes “ ixpertos ”, pois na hora a palavra vidozzah era mostrada com essa grafia “ descolada ”,não era um vidoza apenas, era um “ vidozzah ”, para um conteúdo meio auto ajuda e é isso que, entre as mentalidade Vila Madalena fez tanto sucesso.
Não quero interpretar o sonho, mas é escancarado o quanto essa mulher é uma versão Vila Madalena de mim mesma, e acho ( não garanto ) que é exatamente o que estou pensando, quando o narrador, como que discordando, comenta que a mulher tinha marido e dois filhos, o que quebra o paralelo comigo.
E aqui vem a parte de longe mais impressionante nesse sonho, que agradeço não ter esquecido.
Dando prosseguimento, o narrador meio que atinge o ponto que eu logo de cara tinha percebido, que a mulher não era feliz, mesmo tendo coisas realmente boas na sua vida ( e não coisas que ela acreditava serem boas mas não eram/mesmo eu achando o livro dela meio fajuto, ele não era colocado como se fosse ).
Então esse narrador prosseguia algo como “ não eram dessas coisas que viria a felicidade, ou pelo menos, que viria o que a mulher tanto ansiava. Essas coisas vem da escada que se forma de uma pessoa para outra e ao que essa escada leva .”
Essa frase. Essa frase crucial, tenho a impressão, não era muito mais que isso.
O sentido dela era passado muito mais por uma rápida sucessão de imagens, que mostrava uma escada, obviamente de energia ,indo do peito de uma pessoinha estilizada até o peito de uma outra, colocada um pouco mais acima, e dessa segunda pessoinha partia uma outra escada na direção de outra pessoinha.
No sonho tenho uma clara sensação de que “s im,está cert o”. Reconheço ali, no que o narrador descreve e mostra, algo que,muito no fundo de mim mesma, já tinha percebido na vida real do sonho. Do sonho.
Como quando a Barbara Brennan descreve algum fenômeno energético que eu identifico, " ah, ela está falando daquilo lá ”.
E aqui é muito intrigante, pois no sonho eu identifico do que o narrador fala e inclusive admito que ele está certo, que a realização profunda só poderá vir disso, mas agora escrevendo, não. Não sei do que ele está falando a não ser de maneira teórica, tipo ” ajudar os outros é bom ”.
Mas a coisa segue, indo para algo aparentemente mais banal.
Ainda nesse tal centro de chão de concreto, encontro meus irmãos e os amigos dele, e no meio de uma conversa divertida ali, alguém diz algo que não entendo ao que se refere, e olho para meu irmão que imediatamente diz, daquele jeito dele:
– Ah, não espere que eu te explique isso.
Fico mortalmente, mortalmente atingida. Me sinto muito rejeitada. Não tem a ver com humilhação, tem a ver com rejeição, rejeição da parte de uma pessoa com quem achava que poderia contar.
O grupo estava todo se preparando para entrar num cinema para ver um filme e eu, como forma de reação, só tenho uma opção : não ir com eles.
Digo para a Lú que não vou no filme. O João está envolvido com seus amigos e acho que nem nota isso.
Me afasto muito, mas muito triste mesmo.E stá sol, o lugar está cheio de gente e vida, mas eu estou arrasada de tristeza e me sentindo solitária ao extremo. A única coisa que posso fazer é trabalhar.
Trabalhar, trabalhar, trabalhar. Não tenho mais nada na vida.
Pego uma pilha de desenhos e procuro uma mesa, a mesa que gosto.
Vou me deitar na mesa antes, penso, e tomar sol.
No sonho isso me parece algo extremamente desejável, algo que me daria prazer. O trabalho, não que eu desgoste, mas está se tornando pesado por ser a única, a única coisa que faço o tempo todo.
Procuro minha mesa preferida, que é, assim como no sonho da caverna, uma mesa longa de concreto.
Todas as mesas estão tomadas.
– Cadê a minha mesa? penso. Não consigo localizá-la, mas tanto faz. Não tem uma única mesa vaga, mesmo que eu consiga encontrá-la, tem gente nela com certeza. Mesmo as mesas sem ninguém tem cafés e bolos de chocolate colocados ali para marcar lugar.
Acho me ajeitando onde dá.
O único momento de prazer ao meu alcance,tomar sol, não é possível.
Procuro me concentrar no trabalho.
Tenho uma série pesada de imagens para desenhar e não parece ser o Toutladanse e sim um trabalho para um cliente.
Então começo a fazer uma preparação para uma dessas imagens,c omo se fizesse no papel isso que faço no computador, de montar uma espécie de lay-out das cenas usando as referências que tenho.
E a cena em questão seria assim:há uma grande onda e debaixo dela, um casal se beija.
É engraçado pois ontem fiquei parada olhando para uma imagem de uma grande onda no pinterest, daquele jeito “ parada olhando ”mas não peguei porquê achei que a foto não renderia um bom desenho pelo fato de ser quase um detalhe da onda. " Acho que nem vai parecer onda, vai parecer uma coisa qualquer”, pensei. Isso na vida real.
No sonho, a referência que estou usando para a onda é super parecida e no sonho fico incomodada com a mesma coisa:que não vai ficar ótimo. É uma onda, mas falta beleza, falta enquadramento legal, estética.
Mas estou comprometida com um prazo, aquela imagem não é excelente, mas resolve, então preparo um rápido lay out e passo para a seguinte.
Nesse momento meus irmãos voltam do filme. Meu irmão está com a expressão de que viu que me magoou. Minha irmã não se deu conta de nada e me pergunta onde eu fui e eu respondo que fiquei trabalhando.
Minha irmã está empolgadíssima com o filme, fala que foi um dos melhores filmes que ela já viu na vida. Me descreve cenas. Vou ficando bem arrependida de não ter assistido. Naquela vida árida que eu levava, cheia de circunstâncias fora do meu controle, como o lance das mesas, assistir a um bom filme estava totalmente dentro das minhas possibilidades e eu abri mão disso por ressentimento. Meu irmão também comenta o filme mas percebo pelo jeito dele que se sente culpado de ter, de uma forma que ele não sabe qual, me magoado e procura um jeito de se redimir.
A Lú diz que vai assistir o filme de novo, na sessão seguinte, e me convida para ir com ela.
Fico altamente tentada, mas o ressentimento fala mais alto e eu recuso. Então meu irmão diz:
– Posso tocar o seu cabelo?
Sei que ele está tentando algo para se redimir,mas minhas solidão já atingiu uma proporção tão grande,que aquilo me parece uma gota no oceano.
-Sim,digo.
Então, ainda falando do filme, descrevendo as cenas, e ainda tentando me convencer a ir ver, ele se aproxima de mim, que estou sentada, e de pé atrás de mim afunda os dedos entre meus cachos e... meu cabelo está não exatamente pegajoso, mas duro.
Tem uma frase do Seinfeld:se eu afundar os dedos no cabelo dela, é fácil retirar a mão?
É exatamente isso, sei que meu cabelo prende os dedos do meu irmão de modo que ele tem que, disfarcadamente para não me ofender, se esforçar para arrancar a mão.
Tentando manter as aparências, ele retira a mão e então começa a fazer uma espécie de coque no meu cabelo, mas um coque alto no cocoruto.
Quando termina,diz:
– Pronto,agora ficou bonito.
Sei que não ficou nada bonito. Mais uma coisa depressiva na minha vida, aquele coque feio que me deixa pior do que antes até, mas....
É como se eu estivesse sendo vencida pelas coisas que recebo.
O comentário inicial. A solidão. A falta de mesa. E agora isso de ser enfeiada.
Fiquei sozinha, sem mesa, sem sol, só tenho trabalho na minha vida e ainda por cima fiquei feia com esse penteado horrível. Isso é o que vem para mim, penso. Nada me resta a não ser lidar com isso.
Meus irmãos se afastam.
Estou esquecendo algo?
Então num flash, antes de despertar essa cena:
Duas pessoas,vagamente um homem e uma mulher, vestidos em trajes masculinos de faroeste, com aqueles chapéus que cobrem os rostos, se abraçam com muita ânsia. Obviamente um encontro forte para ambos os lados.
Aquelas duas pessoas eram parceiros que se reencontravam.
Uma cena em tons de amarelo.
IMAGE CREDITS ED SINGLETON | SUNGHEE KIM | W MAGAZINE DECEMBER 2015