O FOFÃO NA PORTA

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{28 de fevereiro de 2016}

Fiquei perturbada por esse sonho. Essa é a palavra.

Ele é enigmático demais para de definir como bom ou ruim. Perturbador.

É super padrão isso, mas sempre acontece: acordo meio bodeada. Maaaais um sonho.

Nem quero muito escrever. Depois de um tempo fico até pensando, nossa, mas sonhei mesmo tudo isso?

Ou começa já no ônibus ou um pouco antes disso, tendo eu comprado um livro.

Na verdade O Livro.

Havia algo muito especial sobre esse livro. É meio difícil de explicar.

Mais ou menos: haviam acabado de lançar um livro que seria baseado em algo, ou uma coletânea sobre algo, que não era um livro.

Isso era uma coisa sobre esse livro, não era como se o livro fosse o ponto original da criação. Havia esse algo, que de certa forma já era de conhecimento geral e que despertava interesse e então havia sido escrito esse livro sobre esse algo, que era um livro muito aguardado, justamente por ter organizado ou coletado esse algo em forma de livro.

E a outra coisa especial sobre ele é que quase que ainda nem havia sido lançado exatamente. O que eu tinha comprado era como se fosse uma pré-venda, como aquelas pessoas que vão a pré estréia de filmes.

Então eu estava me sentindo muito feliz e sortuda por ter adquirido o livro, que e essa era a terceira coisa sobre ele, era enorme.

Não exatamente grande, mas grosso.

Tipo uns dez cm de lombada.

Não lembro da cena em que consigo o livro, talvez nem exista.

Mas em seguida estou num ônibus, um busão mesmo, sentada num banco da frente do lado esquerdo, tenho o precioso livro nas mãos e sentindo isso mesmo, que o livro era precioso, e minha mãe está de pé ao lado, se segurando naquela barra de cima e eu abro o livro, meio que olhando direito pela primeira vez e.... minha mão esquerda que estava suja de algo que parece ser bananinha faz um sujo enorme na página de frontispício do livro.

A mancha é marrom escuro, como se fosse cocô. Mas não é cocô nem chocolate. Lembro bem que era bananinha, aquele doce bananinha.

Fico arrasada .Agora até me parece exagerado o quanto fico arrasada.

Será esse o ponto até?

Fico arrasada demais. Aquilo estraga tudo aos meus olhos. Seria o equivalente ao livro ter caído no esgoto, como se praticamente o inutilizasse aos meus olhos.

Me sinto péssima por ter estragado por completo descuido meu precioso livro. Abaixo a cabeça em desespero sobre ele pensando “ E agora, e agora,que farei? ”

Minha mãe está ao lado e tenta ajudar, mas aquilo me parece sem solução.

Não posso trocar esse livro com uma mancha que obviamente foi feita por mim, digo a ela, e agora, não tem jeito!

No sonho não é como se esse desespero fosse totalmente justificável, como se o livro fosse algo passível de ser arruinado por uma mancha.

Mas por outro lado o sonho não chega a colocar como se eu estivesse exagerando. Agora escrevendo é que me ocorre esse pensamento. Será que o sonho queria me mostrar que estou exagerando?

No que estou achando que aquilo é uma tragédia, uma figura masculina meio recorrente nos meus sonhos, a figura masculina vaga e meio gozadora, vem pelo corredor do ônibus e se interessa pela minha dor.

Imediatamente mostro a ele o livro, naquele jeito que fico quando estou às voltas com algum dilema, e acabo contando para todo mundo meio até como forma de ver se me surgem idéias para resolver. A figura masculina, que ostenta uma certa autoridade ali dentro, como se fosse um guia de excursão, se interessa pelo meu problema e me escuta com simpatia, e no que explico, ele pega o livro das minhas mãos com ar de quem vai resolver o problema.

Tenho um segundo de esperança e então... o cara me abre o livro, que nesse momento se configura como sendo feito de pequenos fascículos encadernadinhos, não como revistas, as lombadas são duras, como finos livros dentro de um livro, e tem cores diferentes, bem interessante até, e o cara alegremente sai distribuindo os fascículos entre os passageiros do ônibus, dizendo que “ todo mundo tem que poder ler esse livro ”, algo assim.

Fico desesperada! Eu que achava que tinha um problema, penso. Agora nem o livro tenho mais!

Me esforço para não demonstrar que não gostei, pois seria indelicado,egoísta e pareceria que não confio naquelas pessoas, o que é em parte verdade.

Digo a mim mesma:

– Esse cara está no controle aqui do ônibus e com certeza vai recolher meu livro depois e me devolver direitinho.

Procuro então me controlar e aguardar.

Então o ônibus chega e seria como se todos descêssemos num tal lugar onde ficamos ali, como se fosse uma praia. Não é uma praia, nem um gramado, mas as pessoas, que parecem ser as do ônibus, estão por ali, sentadas ao sol.

Muito de forma vaga, o livro não está mais disperso. Está novamente sob a forma de uma coisa só,que ao que parece se transformou numa caixa de giz de cera, mas que ainda é o livro, como se fosse uma nova forma do livro. E acho que está com os passageiros ainda, porquê o que acontece é que uma mulher mais velha, que também parece como uma figura de autoridade no grupo, me chama com ar muito solícito e me diz que notou um problema.

Vou até ela que está sentada em meio ao seu grupo particular.

A caixa de giz de cera, que é o livro, está junto a ela.

Deixei de ficar aflita pelo fato do livro não estar mais em minhas mãos, não tenho mais a impressão de que irei perdê-lo, ele está apenas circulando.

E como começo a notar, todas aquelas pessoas ali estão super interessadas em me ajudar em relação ao livro, e mesmo ele não estando nas minhas mãos, elas todas me tratam como a proprietária do livro, e a pessoa que teve a sorte de conseguir o livro.

Então essa mulher, de clara autoridade ali, me chama com ar de quem vai me dizer algo importante e que está toda interessada na minha causa.

Aponta a caixa de giz de cera, que está no chão diante dela e fala:

– Olha, descobrimos que veio faltando uma cor, o preto.

As pessoas do grupo dela, que tem uma atitude meio deferente em relação a ela, como se ela fosse a líder, indicam a caixa de giz, onde eles tinham arrumado direitinho os giz com as cores, de modo a facilitar que eu percebesse que faltava o preto.

Seria como se aquele grupo tivesse pego os fascículos e juntado novamente no livro, e nisso eles viraram giz de cera que compõe uma caixa na qual faltava o preto.

Começo a ficar até comovida de perceber que aquele grupo de pessoas tinha tanta atenção e cuidado com o livro-caixa-de-giz-de cera.

Eu me aproximo para olhar pensando confusamente em como lidar com essa nova informação, para resolver o dilema que ainda me atormenta: a mancha que ao meu ver estraga meu livro.

No que estou nisso, do outro lado da rua, que lembra um pouco a Gregório, na frente de uma das casas, que lembra a da Aurora, há um ajuntamento de pessoas, num grupo grande, de 10 para cima, todos acompanhando a cena e eles começam a abanar os braços e gritar coisas, dando palpites.

Aquilo me faz perder o controle.

Me viro e grito, brava:

– Vão cuidar da sua vida!

Imediatamente um silêncio meio contrangido se instala. Percebo que fui grossa e ao que tudo indica, injusta, pois aquele grupo também estava tentando ajudar.

Em minha defesa posso dizer que nem me passou pela cabeça que tanta gente estivesse tão interessada em me ajudar, achei que estivessem caçoando, algo assim.

Nesse momento há uma menina comigo, que me lembra vagamente alguém.

Ou seria alguma amiga de infância esquecida, ou seria talvez eu mesma, pois a menina é clarinha, com cabelo castanho meio parecido com o que eu usava.

Ela me olha de um jeito que fica claro que está meio constrangida pela minha agressividade com as pessoas do outro lado da rua.

Mas ninguém ali menciona nada. Fico envergonhada. mas ninguém comenta nem me repreende e agem como se nada tivesse ocorrido.

Estou arrependida e fico na dúvida se falo nisso com a menina, para talvez me explicar.

Mas acabo dando prioridade ao livro.

Digo a ela:

– Olha só,s erá que agora consigo trocar o livro, já que veio faltando a cor preta?

Minha idéia era aproveitar que o livro veio com um defeito de fabricação mesmo para trocar o defeito que eu mesma havia causado.

Nem agora sei dizer se isso seria certo ou errado.

No sonho estou disposta a tudo para ter meu livro impecável.

Digo a menina, rindo:

– Você vai comigo,com um monte de crianças, se não me deixarem trocar você começa a chorar, tá?

A menina acha uma certa graça. O respeito dela por mim parece ter sido meio abalado pelo meu grito anterior. Ela ri do meu comentário mas noto que ainda me olha meio incerta, sem saber o que achar de mim.

E com isso o sonho toma outro rumo.

Mas é uma sequência.

Estou no apartamento, aprontando minhas coisas.

Não existe um objetivo definido. Existe uma sensação de atraso, ou ela viria depois, talvez.

Quero ser precisa pois essa foi a parte mais impressionante de um sonho já em si muito forte.

Estou para lá e para cá, nessa aprontação na qual me sinto um pouco, um pouco fazendo corpo mole, como se estivesse hesitando.

Então vou no banheiro fazer xixi e sentada no vaso vejo que estou com um grande modess noturno e ele está com uma boa quantidade de sangue.

O que mais me chama a atenção inclusive no próprio sonho,é a naturalidade com que reajo a isso. Tenho plena consciência de que aquilo é quase um milagre, estou sem menstruar um ano. Isso na vida real, mas no sonho sei disso.

Minha preocupação se foca em ter certeza de ser sangue mesmo.

Olho com cuidado e penso:

– Sim,é sangue sem a menor sombra de dúvida. E bastante,ainda por cima.

Meu cliclo voltou.

E em seguida penso:

– Nossa, devia estar dando pulos até o teto. Estou feliz, mas não eufórica.

Mas talvez isso seja bom.

Volto aqui para a sala da kit, que é onde estou.

A Lúcia, que estava ali comigo em parte me apressando, meio que como que desencana de me esperar e diz:

– Olha então eu tô indo, tá, te espero lá fora.

Tipo indo na frente.

É nesse momento que fica mais definido essa atitude minha meio “ não estou indo tão rápido ou tão decida quanto poderia, será que estou hesitando? ”

Nem chega a ser 100% de certeza, é mais uma dúvida que me passa pela cabeça.

E então tenho a nítida sensação de algo se aproximando pelo corredor.

Estou olhando para o chão e essa sensação dura o instante de levantar a cabeça e olhar e nesse instante que antecipa.tenho consciência de uma certa expectativa... que se frustra totalmente.

O que encontro diante da minha porta,c om aquela numinescência que tem certas figuras em sonhos, o Retardado com o Realejo, que a meu ver anunciou o Adriano, a figura que entrava pelo apartamento da Padre, no sonho

A numinosidade dele na minha porta

Ele está parado na entrada, revestido de algo também raro em sonhos, mas já aconteceu umas vezes: numinosidade.

Ele tem uma energia tão real, é difícil de descrever, acho que uma vez disse, é como se alguém real, mesmo que seja um guia, um espirito protetor, mas alguém de fora da minha psique, que viesse me visitar em sonho.

Ele é um homem perto dos 40, bem atraente, que me lembra aquele Alex da 02, no rosto, mas bem maior e mais alto de corpo, mais forte.

Eu então tenho uma reação que me surpreende. Como uma pedinte, pego a mão dele e digo:

– Eu estou com medo.

 ,é uma figura que imediatamente me assusta e me repugna.

Está ali um morador de rua, um mendigo. Ele é idoso, isso fica em primeiro plano.

Associações com meu pai não me parecem ser o caso, pois ele fisicamente está ok.

Está com um saco de mendigo nas costas e tudo o que me repugna e assusta se concentra no rosto dele.

Aqui é estranho. Ele não tem um rosto idoso realista. Ele tem umas papadas quase surreais que descem pela sua face, rodeando os olhos. mas de forma totalmente fora do que seria um rosto idoso real. Ainda assim tem algo familiar.

Acordada, pensei e me lembra duas coisas:aquela bochecha do Fofão, se elas estivesse aplicadas numa cabeça de dimensões normais, humanas,e fossem da cor de pele clara, já que o Fofão é marrom e o Homem Ameixa daquele filme Dick Tracy. Talvez mais para esse último até.

O Homem está parado a minha porta. Não ostenta atitude ameaçadora. Aliás posso dizer que, debaixo de todas aquelas coisas que me causam repulsa, seus pequenos olhos, pequenos como os do Retardado do Realejo, tem um brilho até benéfico.

Ele não parece sujo.

Fico com medo.

O pensamento que me cruza a mente é algo assim:

– Meu, fiquei aqui enrolando e porisso esse homem apareceu.

A sensação que tenho é de que, por ter relutado em “ ir em frente ” não sei exatamente com o quê, mas naquele instante fica em parte claro que a Lú queria que eu saísse da kit, que me mudasse de lá, por ter relutado, a Miséria e a Velhice, pois isso era o que essa figura me parecia, não como se fosse um mero morador de rua e sim como se fosse uma espécie de Cavaleiro do Apocalipse representando a Miséria e a Velhice, batera a minha porta.

Vou até a porta, pelo menos não tenho medo de reagir, e fecho a porta na cara dele. Não sei se digo algo.

A porta estranhamente é de madeira crua e tem três tramelas. Passo as três tramelas.

Olho a porta e digo a mim mesma que não tem como aquela porta ceder. Fico a espera de algo, de que o cara derrube a porta, talvez. Não lembro se isso ocorre.

OK, guias, tenho que ser sincera e dizer que, apesar dessa “ figura numinosa na porta " tem sido anúncio da entrada de pessoas importantes na minha vida, tem chance de significar que tenho que ir para a casa de madeira, senão...

Tá, outra observação racional: a mancha no frontispício do livro parecia também uma mancha de sangue inicial num modess, pelo formato e cor, quando vem aquele sangue marrom escuro.

 Parece também a versão idosa daquele personagem daquele filme do menino que tinha Elefantíase,e que era ruivo.

IMAGE CREDITS JOSEPH CHEN | ASTRID RONNBORN + STEPHANO MADERA | FASHION EDITORIAL " MISTERY MURDER " |

O FOFÃO NA PORTA

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