{17 de fevereiro de 2019}
Esse foi o tipo abalo sísmico.
A Adriana Londoño está ao meu lado e num tom de voz muito cheio de sentimento me fala assim:
– Eu acho que você está se encaminhando para algo muito sinistro.
Não lembro se o termo era esse, sinistro.
A medida que ela avança na frase sei o que vai dizer.
A frase é algo não mais que isso, mais deixa claro, um futuro terrível.
Tenho uma reação que não me agrada muito.
Nem ao menos sei explicar minha reação. Aliás seria quase como se eu, mesmo não estando incorporada, fosse mais a Adriana do que eu mesma.
Respondo num tom de voz ligeiramente ríspido.
– O quê, ficar velha sozinha, solitária e amarga?
Pego o que ela esboçou e já levo para o extremo do pior, como se quisesse deixar claro que eu já tonha pensado nisso e não me assustava completar a idéia.
Não tem o menor tom de maldade na voz da Adri.
Ela parece genuinamente preocupada comigo.
Eu é que estou meio estranha, alias, amarga seria a palavra.
Prossigo dizendo:
– No que depende de mim estou fazendo o que posso.
– No que depende de você? ela me diz. Só depende de você, complementa.
Então minha atitude estranha fica mais intensificada ainda.
Na verdade para deixar claro, a attitude não é estranha exatamente, é a minha atitude habitual, mas fica claro o quanto ela tem sim de amargura e frustração.
De um ponto muito absoluta de certeza e experiência eu pronuncio com toda intensidade as seguintes palavras:
– Só alguém que nasceu ontem acha que tudo só depende de si mesmo.
Depende da pessoa e de Deus.
Estou meio na dúvida agora se a ordem foi essa mesma, mas mais ou menos foi.
Não estou me sentindo superior mas é uma certeza que foi cunhada na frustração e amargura então mesmo sento tecnicamente correta, é algo ruim. Esse é a contradição.
Sim, estou certa. Mas cheguei a essa conclusão acumulando frustrações e amarguras e me sinto amarga e frustrada dizendo isso, mesmo havendo nisso um genuino sentimento de amor a Deus.
Não lembro se tem mais algo dito antes que ela pergunte mais ou menos:
– Mas então prá quê serve (e aqui não lembro o que seria, mas o sentido geral seria algo tipo:mas então que sentido tem tudo isso?)
Então respondo o que é a frase mais forte do sonho:
– Os caminhos de Deus são imprevisíveis e essa é a graça.
Apesar de todo o ressentimento e amargura contidos na parte anterior do diálogo, essa última parte soa sim com uma esperança verdadeira.
E então progride da seguinte forma.
Tudo é um filme que assisto. De um certo tipo de filme que é muito bom, mas não gosto de ver pois não provoca coisas boas.
Foi muito muito forte e me abalou como um pesadelo. Acordei no meio da noite e não queria dormir só para não voltar a sonhar com aquilo.
Numa tomada aérea era mostrado o pequeno sobrado onde a trama se desenrolava.
O menino tinha um padrasto. Sua mãe, uma mulher ainda relativamente jovem havia se casado novamente com um homem um pouco mais moço. Mas muito pouco, uns 5 anos talvez. Tudo tinha cara de anos 70-80 na Inglaterra.
Não era super atual.
O padrasto era um serial killer. Desses barra pesada mesmo, bem perturbado.
O menino,q ue deveria ter uns 13-14 anos, estava no andar de cima quando por uma abertura que não sei como tinha ali no lance da escada e que possibilitava ver o interior do banheiro, testemunhava o que havia acabado de ocorrer:seu padrasto finalmente havia sido tomado pelo seu lado doente e assassinado a mãe no banheiro, dentro da banheira.
Engraçado. No sonho o clima é pesado, doente e aterrador, mesmo com a ambientação típica dos anos 70-80 e aquele colorido todo.
A cena tem uma música que sobrepõe de uma forma brilhante vários layers e é simplesmente vertiginosa e hipnótica, ao mesmo tempo que meio doente, criando justamente a atmosfera vivenciada por aquela criança.
Ele se sentia hipnotizado por algo profundamente doentio, que era aquela maldade do serial killer, mas que se fundia com algo sexual, pois a mãe meio nua que o menino via ali da abertura no teto era uma imagem de beleza e atração sexual e outra coisa que ficava muito forte era a maldade profunda, profunda, quase demoníaca que emanava do homem. Não era um homem, era um demônio. E pensando friamente, o ato em si era um assassinato meio básico.Mas todo esse rodamoinho de doença e perversão estava sendo gerado pela figura do serial killer.
O menino sentia como se não tivesse mais controle de si mesmo e como um îmã, estivesse sendo irremeciavelmente atraido para o serial killer para de alguma forma ser uma vítima dele, não exatamente sendo morto, mas sendo para sempre pervertido.
Estou fisicamente identificada com o menino, mesmo que esteja assistindo o filme com todas as características de um filme. Penso naquela música treslumbrante, penso que o filme não me traz sentimentos bons, mas estou vendo, é um filme mega bom e a cena é brilhante. Mas ao mesmo tempo em parte eu sou o menino, ou o comando.
E então fica a seguinte coisa muito ambígua pois apesar de aparentemente super positiva não sei se foi mesmo e já explico.
O menino está lá observando daquela fresta no chão.
Fica em aberto se o serial killer sabe ou não que o menino está vendo. Nesse momento ele não é humano, ele é um tubarão com aquele olho de breu morto. Porisso que senti o sonho do tubarão como uma espécie de triologia.Naquele momento, totalmente expressando sua natureza doente, o serial killer é um tubarão sem alma que apenas destroe e destroe. Um demônio mesmo.
Lá de cima,por sua vez, o menino apesar de uma criança, tem uma clareza total sobre o coquetel de forças em ação sobre ele. Sente a excitação sexual quase inevitável diante de uma bela mulher nua, mesmo sendo sua mãe. Apesar de ser uma sensação que lhe causa aversão, ele em parte sabe que com aquela idade isso é inevitável.
Sente algo doente e demoniaco no serial killer o atraindo como um vórtice e tudo aquilo fechado ali dento daquela casa acarpetada com suas janelas cerradas. O menino se controla, pára de espiar pela fresta e olha a escada diante de si.
Posso desenhar a planta de tão definida que fica.
Se ele descer o lance de escada estará diante da porta de saída da casa.
Se ele descer a escada e virar a esquerda 180 graus estará no corredor onde fica a porta do banheiro e se ele encarar o serial killer será aprisionado para sempre num mundo de doença e perversão dentro daquela casa.
Ele se controla e faz o que é o certo.
Desce a escada, abre a porta da rua e foge, indo na direção da bola luminosa do sol lá for a até se fundir com ela, como se tentasse assim se purificar de todas as experiências dontias que se acumularam nele.
Aparentemente é o que ele faz, mas…
Mas não sei explicar.
Há algo estranho.
Como se por exemplo o menino não tivesse saído de fato da casa, apenas fantasiado com isso. Ou como se mesmo saindo, e alias é esse pensamento que tenho no fim desse sonho, mesmo saindo uma boa parte dele já pertencesse ao serial killer e então pemanecesse ali na casa para sempre, como um fantasma dele mesmo.
A única coisa que consigo entender desse sonho é que a imagem que tenho feito do Homem Exorcista, por quem tanto rezo, é de uma bola luminosa brilhante.
E o desejo daquele menino era se fundir nessa luz e assim se purificar, tornar a se purificar.
IMAGE CREDITS DIOR BALL OF DREAMS 2024