O RIO E A MOCHILA

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{14 de fevereiro de 2020}

Então situando ontem a reunião com o André e tenho uma rota para ter o filme no canal de streaming dele e outros na sequência.

Sério, melhor impossível.

Ainda não dinheiro mas algo muito precioso,visibilidade.

Desde o início nós 3 nesse bote.

É um bote mesmo. Cabe nós 3 e quase mais nada.

Eu estou meio de convidada ali.

Esse rapaz era casal com essa moça e na verdade não tem uma super ligação entre nós. Fica aliás quase como se eu em parte estivesse me intrometendo, como se por acaso estivesse ali nesse bote e tendo sido posto o bote em movimento, não tinha mais como eu descer então havia sido formada a situação. Não chegava a ser algo ruim, pois eu era só mais uma passageira ali, mas eu mal conheço os dois.

Depois de uns instantes iniciais nos quais fica aquela coisa de “será que devo descer, afinal não fui super convidada”, passa tempo suficiente para que eu me sinta autorizada a parar de pensar nisso.

Estamos todos meio deitados ou reclinados nesse bote e ele vai percorrendo um rio ou um riacho.

O riacho é estreito, na verdade apenas um pouco mais largo que o próprio bote.

E desde o começo tem essa coisa de que o bote, mesmo sendo um bote sem motor, sobe o riacho. Sobe e não desce.

O riacho corre para cima e tem mesmo um aclive suave. O bote corre suavemente.

O riacho é como uma rua fluvial. Ao redor vão passando casas.

E aquilo seria como uma espécie de bairro com pique de Vila Madalena.

Um bairro onde havia se instalado um comércio meio descolado.

Agora escrevendo me veio um flash da loja Santa Fé na Vila Madalena meio decadente e por segundos fiquei achando que essa cena pertencia ao sonho mas não. Eu vi isso na vida real quando fui buscar os sarrafinhos em Pinheiros quando o Lucimar veio instalar a porta.

Não tinha casas ou estabelecimentos decadentes no sonho.

Os estabelecimentos não eram grandes e o bairro estava meio que virando ponto, mas não tinha nada de decadente pelo contrário ,tinha um ar bem fresh.

Estou ali já nisso de desencanar do fato de que estou ali meio de gaiata e aproveitar o passeio e o primeiro estabelecimento que me chama a atenção seria uma pequena confeitaria.

A minha esquerda vamos passando na frente de uma pequena confeitaria. O rapaz no bote conhece o dono e fica comentando com a namorada e é assim que eu me inteiro da história e eu chego a ver imagens do jovem dono da confeitaria flutuando ali, como se eu tivesse acesso aos pensamentos do rapaz, pois ele deveria estar pensando nesse amigo dele enquanto comentava com a namorada.

O rapaz dono da confeitaria seria jovem, no máximo 30, lembrando muito fisicamente o Franklin que fez teatro comigo. Uma pele meio parda.

Ele era um confeiteiro muito apaixonado pela arte da confeitaria e havia comprado aquela casinha ali que devia estar bem precária e reformado para transformar na confeitaria dele.

Como isso irá se repetir 3 vezes durante o sonho, acho que o assunto importa e vou relatar o que me passa pela cabeça.

Primeiro que a confeitaria era um encanto, uma pequena casa em madeira branca com lambris em madeira pintadas de azul e detahe, essa casa e as outras estavam nas bordas do riacho mas acima dele e por estarem sobre as margens, que naturalmente eram em rampa, estavam sobre palafitas.

Não é a primeira vez que sonho com casas de madeira sobre palafitas.

Mas no sonho anterior em que tinha isso,lembro que as casas, apesar de encantadoras, eram meio precárias ,tipo Paranapiacaba. Mas aqui não eram.

Eram pequenas, estilo tiny house, mas super fofas e legais.

Olhando a confeitaria e escutando meio distraída o rapaz comentando com a namorada sobre o amigo confeiteiro, a primeira coisa que me passa pela cabeça é:

– Mas será que docinhos vão conseguir dar lucro para sustentar essa loja?

Esse pensamento, mesmo que tenha esse teor, não vem com maldade.

Na verdade vem com uma mistura de admiração e inveja boa.

O cara havia investido grana ali. Para montar uma confeitaria que vendia docinhos.

Parece que ele morava ali também. Mas mesmo assim.

Quanto lucro aqueles docinhos podiam gerar? Por outro lado no fundo é mais um questionamento a mim mesma, pois a confeitaria estava ali, toda bonitinha então o que de fato me passa é que eu não devo ter razão.

E no que o bote está passando em frente da casa eu vejo com super nitdez a reforma simples mas caprichada que foi feita, com a parte de baixo da casa, a apoiada nas palafitas, toda reformada em madeira branca toda limpinha e bem feita e a entrada ali da casa a esquerda com uma palataforna que chegava até a frente.

Nesse momento estou sim desejando ter feito algo assim para eu morar e me vem um pensamento que sei que é errado mas de novo não contém maldade.

Penso que se a confeitaria falisse eu poderia comprar a casa e morar nela.

É um pensamento mau, sim, mas o que vem nele não é nem um desejo de que o confeiteiro fracasse e sim uma crença meio fracassada da minha parte de que essa seria a única maneira de eu poder ter uma casa como essa.

Uma vez desejei que a atriz principal de uma peca de teatro ficasse doente para eu poder substituí-la. O ator comentou comigo que era um desejo errado e eu dei razão a ele. O ponto é que nem tinha me dado conta. Tudo o que eu queria era uma oportunidade de atuar, coisa que cheguei a desejar muito e naquele tempo estava fora do meu alcance.

Será concidência? Pois já pensei na vida real outro dia,e foi um pensamento meio inédito, de que a vida deu uma volta de tal maneira que me colocou diante de uma maneira legítima de realizar esse desejo.

Coisas que não me pertencem...

Ali no bote olhando a casa com essa tristeza, também tenho consciência de que aquele rapaz, que está bem perto de mim, também não me pertence.

Pertence a namorada dele.

Mas está muito perto de mim e noto em mim o desejo de ter contato físico com um homem.

O bote segue por esse riacho e aqui tenho dúvida da sequência.

Acho que a casa no alto do riacho vem antes.

Pois passamos por essa confeitaria que eu cobiço e o bote segue e numa espécie de culminância disso de ser um bote que está subindo o rio ao invés de descer,ele sobe uma parte um pouco mais inclinada ainda que a que vinha subindo e chega numa espécie de fim do riacho, como se fosse um beco se saída. E bem de cara ali no que seria a parede cega do “beco” está ,também em nível elevado em relação ao riacho, uma casa de madeira bem maior que a confeitaria e muito bonita.

Então meu deslumbre pela linda confeitaria é subsitituído pelo deslumbre por essa casa maior.

Acho até que o rapaz desce com a moça para irem até a casa.

Todas as casas ali tem essa espécie de caminho de madeira como esses que tem no porto, acho que as pessoas encostam com o barco e descem.

O que se passa dentro de mim nesse momento é que percebo uma espécie de... então meu destino não era a casa do confeiteiro, era essa.

Destino não no sentido de pegar a casa do confeiteiro, mas eu já estava em parte tenando planejar como ter uma igual. No que vejo essa segunda casa esse objetivo anterior é meio que substituído por esse novo, uma casa como essa.

Mas a partir dali algo se passa na minha cabeça que eu meio que largo mão de formatar meu objetivo, sim,i sso é uma frase já explicativa, mas sem já ir explicando,algo se acalma dentro de mim. Algo que poderia, sem cair em explicações, ser traduzido assim:

– Calma, não precisa achar que esse é seu destino final.

Não é uma sensação ruim, é uma sensação boa.

E boa em relação a mim mesma pois paro de me ver como uma fracassada que não conseguiu uma confeitaria como aquela.

Hm. Isso super bate com a realidade.

Então vem uma linda linda cena.

Mesmo que aquilo fosse um beco,em seguida o bote segue descendo o rio,e dessa vez está descendo mesmo.

Eu coloquei minha perna esquerda na água, mesmo vestida de calca jeans. Meu pé está descalço.

Está muito bom e me sinto muito bem.

A moça está afastada,o mais que o pequeno bote permite,e o rapaz quase que está deitado colado a mim, na minha frente.

A água limpa do riacho molha minha calça e eu não me importo e em parte tenho esperança de que isso de não me importar me faça parecer mais sensual que a namorada dele aos olhos do rapaz.

Mas também não chega a ser algo que predomine.

Tem algumas pessoas no rio e na margem.

É um momento muito lindo. Me sinto bem e livre, mesmo consciente da falta que sinto de um namorado.

E então algo começa sim a prevalecer ali como foco de atenção.

Minha perna está fora do pequeno bote e isso aumenta a chance do bote virar.

Essa chance já era bem presente, pois o bote é pequeno.

Se o barco virasse, penso comigo, eu cairia nessa água que é rasa como a de uma piscina fora que limpa, ou seja, nada de mais, mas se meus pertences caíssem espalhados na água isso sim ia ser meio chato.

Eu estava tão bem que não estava nem querendo quebrar aquele encanto para cuidar disso mas vou pensando comigo que seria o certo a fazer.

Minhas coisas estavam numa mochila que acho que num primeiro momento é amarela e que se encontra entre minhas pernas mas totalmente aberta.

Se o barco virar minha carteira, meus cartões e todo seu conteúdo vai se espalhar no fundo do riacho e eu terei que parar tudo e ficar catando.

Vou analisando a situação ainda sem me mover, tentando me convencer a fazer algo a respeito.

Tudo o que tenho a fazer, penso comigo, é fechar o zíoer da mochila.

Se eu fizer apenas isso, apenas isso, passaria a outro nível de despreocupação pois se o barco virassse tudo o que eu teria que fazer seria catar a mochila ali daquele rasinho, que estaria molhada mas com tudo dentro.

Isso me convence a dar o primeiro passo que seria puxar o zíper da mochila.

No que vou fazer isso noto que uns componentes elétricos que perteciam ao rapaz tinham por acaso caído dentro da mochila.

Fico pensando em como resolver, se peço para ele tirar, coisa que vai interferir bem mais ali com aquele momento tão bom, ou se apenas aviso para ele que estão ali e fecho a mochila.

Acho que me devido por essa segunda opção.

Ah, péra, antes de entrar na cena que fechou o sonho, um outro detalhe.

No que estou ali com a perna na água, curtindo aquele momento perfeito mas ciente da grande lacuna que existe na minha vida afetiva, percebo que controlo a movimentação do barco meio com um levíssimo impulso do meu corpo.

É só dar uma jogadinha de quadril que o barco toma a direção que eu desejo, mesmo indo contra a corrente do riacho.

Fico muito contente com isso e orgulhosa até. Mas de jeito bom.

Faço isso algumas vezes e nisso é que começo a me preocupar, ou melhor, a tentar me convencer a me preocupar em resolver o lance da mochila para que isso não venha a estragar o que de outra forma estava sendo um momento mágico.

E tendo fechado o zíper da mochila, que nesse momento é bem aquela mochila preta de emborrachado que eu tive em adolescente, me ocorre que segurança total mesmo seria colocar a mochila nas costas.

Sem cair na categoria de “:sonhos que chovem no molhado” esse delicadíssimo sonho retrata sim o que eu sinto, ou o que senti particularmente ontem.

Meu bote segue pelo riacho, agora tenho essa perspectiva do streaming. Não fracassei por não ter conseguido ser atriz, o riacho da vida me levou para um destino melhor. E estou com essa preocupação de garantir minhas finanças para aproveitar o que é sim, um momento mágico.

Agora lembrei do que encerra o sonho. Achei que fosse o lance da mochila mas não é. Ainda bem que lembrei.

Pois bem. No que penso nisso de colocar a mochila nas costas, mesmo percebendo o quanto isso me deixaria segura, pois caso eu caísse na água a mochila estaria fechada a presa a mim, ou seja, nada a se preocupar, mesmo assim não quero.

Acho infantil usar mochila nas costas e ontem ao ver o André sair assim do café aquilo marcou um pouco.

Não quero colocar a mochila nas costas.

No sonho isso vem como uma espécie de impasse.

Sim, quero ficar totalmente segura mas sem colocar a mochila nas costas.

E então vem a cena final, que chega discreta mas depois desse enorme paralelo entre as imagens do sonho e minha realidade, com certeza super importa e vale a pena atentar.

O bote encosta. De repente estamos em terra firme.

Isso até então não tinha ocorrido. Mesmo ali na casa de madeira grande, o rapaz deu uma descida com a namorada, eu fiquei no bote e depois eles voltaram e seguimos.

Mas agora o passeio de bote parece ter encerrado.

O bote nem está mais ali a vista.

Então estamos na margem, ainda fica isso do riacho ali do lado.

O rapaz conversa animadamente com umas pessoas que estão ali.

Eu estou meio distraída olhando ao redor,ou melhor, olhando quase a única coisa que tem ali para olhar e então o rapaz vem para meu lado e meio que ficamos vendo a tal coisa juntos e de certa forma muito vaga o rapaz estaria me mostrando essa tal coisa como se fosse algo para mim, coisa que num primeiro momento eu estranho bastante. Como assim? Esse é meu “destino”?

O que vejo ali é uma construção que poderia ser descrita como um arraial.

É feita de toras de madeira pintadas de preto, como casas desses lenhadores.

Tem dimensão grande, não diria maior que a casa anterior, a do beco, mas é uma espécie de galpão.

Tipo um galpão feito de toras de madeira.

Está em parte meio detonadinho, nada de super grav, mas precisa de uma reforma.

Aquilo está com um tal jeito de estar sendo apresentado a mim que eu em paralelo já estou meio que organizando mentalmente os passos de uma reforma.

A sensação não é ruim. É aliás a meio clássica sensação de estranhamento,mas então como assim, é para eu pegar esse galpão aqui?

E ele lembra sim a danceteria preta ali da cidade do interior que já surgiu em sonho.

Ó guias.

Preciso mesmo é de um namorado, mas enfim, obedecerei.

IMAGE CREDITS JENIIFER ANISTON | HARPER'S BAZAAR JUNE JULY 2019

O RIO E A MOCHILA

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