{24 de agosto de 2024}
Um sonho meio desanimador depois de um dia com coisas bem boas.
Estou nessa coisa que sempre se repete de cidade meio praiana, um cidade pequena, e começa estando eu numa espécie de galpão edícula, um agregado de uma instalação maior como se fosse dentro de uma fazenda, a casa da fazenda e os barracões anexos, mas não era uma fazenda.
Nesse barracão ou anexo eu tenho um job de ilustração para uma editora bem na linha dos que eu fazia para a Scipione e inclusive era uma HQ.
Estava no começo, na etapa de justamente definir o estilo visual e criar os personagens. Era um job, algo que eu fazia estritamente por dinheiro e o fato do sonho me colocar na mais ultrapassada das situações de cara já é intrigante. Outra coisa intrigante é o fato de que não havia nada de over ruim ali. O trabalho era sem interesse pessoal para mim mas nada de mais, eu tinha tempo, não tinha que correr e ficar sem dormir e comer para fechar prazo, tinha comida e tinha um relacionamento meio estranho com a família. que ocupava a casa principal, mas não era isso de estar me sentido isolada, inclusive a família tinha algo muito próximo de afeto por mim.
Aqui começa o padrão geral de todos os níveis desse sonho, que poderia ser definido por "estar a serviço".
O job de ilustração, mesmo provido de dinheiro, respeito e criatividade, liberdade criativa, pois seria eu a decidir o que seria feito, era apenas um serviço.
Essa família tinha afeto por mim, mas era, ou pelo menos eu sentia que era, devido ao fato de eu estar a serviço deles, não um serviço explícito de empregada mas eles encontravam em mim uma espécie de apoio emocional, uma alegria que não encontravam ali entre eles mesmo, e de certa forma "precisavam" de mim.
Eu fico ali no chão desenhando sozinha e penso em usar lápis de cera, acho que desenho o cabelo loiro cacheado da personagem feminina dessa família da HQ. Fica bem nítida essa cena de eu desenhando com um lápis de cera amarelo um cacho de cabelo dessa personagem que comecei a criar pelo cabelo, nem rosto tinha ainda. Estou experimentando soluções ali e penso se não seria melhor desenhar nesse estilo que tenho visto no insta que desenham um bonecos horrososos num traço meio debilóide e não acho aquilo. bonito mas me parece moderno e sendo a editora um cliente, de longe me passa pela cabeça que eu talvez devesse oferecer a eles o que percebo ser a solução mais moderna e eu sempre tive um dom de perceber o que era o moderno e hot no momento e criar dentro daquele estilo mesmo sem ser algo que eu pessoalmente gostasse. Fora que, eu penso, seria muito menos trabalhoso e me sinto meio tonta ali, escolhendo um estilo mega trabalhoso, o lance do lápis de cera, que talvez nem fosse o que fosse ser de maior interesse para o cliente. Fico nessa dúvida e novamente, o sonho não se torna sobre isso, pois tenho tempo de escolher, de mudar de idéia e tenho confiança na minha capacidade.
Então nesse momento vou dar uma passada lá na casa principal e fico lá um tempo e ocorre isso que descrevi, a família me recebe super bem, mas precisam de mim. Não que sejam interesseiros, não seria isso, mas é algo de como eu disse, eu estar a serviço deles e da parte deles não vinha nada para mim a não ser isso que me parecia um quase afeto mas não era totalmente.
É difícil sair de lá pois sou muito solicitada. Vejo o tempo que tenho para concluir os desenhos na etapa em que me encontro ir diminuindo, tenho que enviar algumas páginas prontas para a editora amanhã e ainda nem comecei.
Mas penso comigo que se eu mandasse uma proposta realmente boa, iriam me dar mais tempo se eu peidsse, então não chega a ser um sonho de correr contra o relógio, mesmo que eu veja as circunstâncias delongando mais e mais a minha volta ao trabalho, isso por escolha minha, diga-se de passagem, pois eu não estava sendo retida à força.
Finalmente, por iniciativa minha, resolvo encerrar a vista e voltar ao galpão. A família, ou a parte dela que se apegou a mim me aconpanha. Tem uma moça, um rapaz e um casal de namorados adolescentes. Chegando perto do barracão eu digo:
– Ok, então tchau.
Por que da parte deles iriam junto comigo até sei lá onde.
Dou um beijo no rosto da moça, um mais leve ainda no rosto do rapaz, que lembra o Tomás e atiro um beijo para o casal de namorados, do qual se destaca a moça, que parece uma bonequinha alemã, com um rosto claro como de um anjo, cabelo loiro crespo e bochechas rosadas.
Não vou ficar beijando demais, é melhor mandar beijos de longe.
Então vou para o barracão e aqui vem uma cena que leva ao máximo isso que me parece ser o tema do sonho, que seria isso da minha existência em todos seus níveis ser algo de estar a serviço.
Eu mesma na vida acordada muitas vezes encaro assim, por não ter até o momento uma noção muito definida do que seria uma forma de estar a meu serviço, então aceito pelo menos estar a serviço dos outros ou de Deus.
Pois eu entro no barracão, pensando nas opções de estilo para o job, e há uma grande pia antes da porta da sala onde estão meus raffs no chão, e essa pia tem uma louça acumulada e perto dela, numa mesa de refeitório comunitário, longa, de madeira, uma outra família faz uma refeição e eu, sem nenhuma decisão consciente a respeito, quase que por força da gravidade, vou até a pia e começo a lavar a louça.
Tem duas pecas de prata que parecem essas que tenho sobre a cômoda preta ampliadas, essa baciinha de prata e a outra. A que fica mais em destaque é a baciinha de prata, mas... no sonho ela não seria minha, seria dessa família que está ao lado almoçando. Mas começo a lavar com detergente, a sujeira vai saindo e com um pouco de lavagem a mais estará limpa a brilhante e eu me pergunto mas porquê estou fazendo isso? Isso não é meu. Quando estou ali passando a esponja na baciinha e deixando ela brilhante, isso quase se torna uma visão de riqueza, algo para mim, mas então a baccinha é da família e não minha. e novamente, estou a serviço de outros. Nesse momento a família ao lado, que está bem perto, me olha e não tem a simpatia ou o quase afeto que a outra família, que não tinha parentesco nenhum com essa, tinha comigo. Eles me olham com despeito. Começam a fazer uns comentários falsamente elogiosos mas no fundo meio irônicos sobre o fato de eu estar lavando a louça,, tipo nossa, que convidada ótima, está limpando nossas pratas.
Estou numa estranha inércia que percebo ali nesse instante, não deixa de envolver uma certa vaidade, pois eu penso meio sem pensar que sim, eu poderia lavar toda a louça, limpar a prata e ainda assim fechar o trabalho com qualidade e isso não deixava de ser verdade mas...
A verdade que importava era que nada, nada, nada disso era algo que eu estivesse fazendo por que desejasse fazer, ou me fizesse feliz fazer.
E tem algo que lembrei. Quando escuto os deboches dissimulados da família e sigo lavando a louça, começo a fazer um estranho plano de ficar morando nesse local, onde teria a semana sozinha para trabalhar e no final de semana a presença dessa primeira família, a que me tinha um quase afeto e isso poderia constituir a minha vida. Trabalho e amor, como disse Freud. Mesmo que não fosse nem uma coisa nem outra.
Ó Jesus. Não preciso mais de sonhos me mostrando o que estou fazendo de errado. Me mostrem qual seria o certo a fazer.
IMAGE CREDITS NORMA JEAN ROY | GEMMA WARD | VOGUE US DECEMBER 2007