{20 de outubro de 2015}
Deixou uma sensação forte mesmo o “roteiro” não tendo nada de mais.
Estou envolvida num grupo ao qual não sinto que pertenço.
As pessoas ali não chegam a gostar de mim. Aliás elas não chegam nem a pensar no que acham de mim. Estão envolvidas demais com as pessoas e coisas que consideram importantes e mal registram minha existência.
Eu, por outro lado, procuro me tornar útil para elas e assim cavar minha participação no grupo, o que, se não fosse por isso, tenho certeza, não seria desejada ali.
É engraçado porquê enquanto escrevo, esses sentimentos ecoam muito forte, sem que eu saiba dizer exatamente em que situação da minha vida real.
Parece ser uma coisa óbvia, que me sinto dessa forma, por outro lado, tem algo confuso, uma sensação de que existe algo ainda a ser entendido sobre isso.
Essa minha utilidade, apesar de envolver tarefas práticas, tem muito mais a ver com dar forca ao ego das outras pessoas, não na base do fingimento, mas me pondo de platéia ali para cada um deles.
Por mais que desprezem a platéia, todo ator precisa de uma e é assim que sinto que sou vista. Como um ser genérico, sem identidade própria, que exerce a função de aplaudi-los.
Estou sempre muito ocupada indo para lá e para cá, mas essa movimentação toda é exclusivamente direcionada aos interesses dessas outras pessoas do grupo.A única coisa que pareço fazer para mim mesma é comer.
Tem um grupo de três garotas, com as quais passo mais tempo, que normalmente estão procurando parecer sedutoras e interessantes para os rapazes e eu as ajudo.
Tem uma hora em que preparam toda uma falsa cena de “estamos dormindo”, porquê sabiam que esses rapazes iriam entrar no quarto e queriam parecer belas e sedutoras dormindo, mas é tudo preparado, inclusive quando eu apago ou acendo a luz, para completar a coisa toda, uma delas, a mais proeminente, me dá ordens em contrário.
Essa é minha vida.
Então chega um momento que acho que basta.
Isso sim ecoa um pouco mais claro na vida real.
De alguma forma acho que “já deu”.
Não no sentido de eu ter me enchido, o que seria até justificável, mas como se eu sentisse que “devesse”algo, tivesse um karma a pagar, ou aquela submissão tivesse um propósito maior. Mas então, de uma forma que nem chega a ser revoltada nem nada, apenas penso que “já deu”.
Estamos indo todos a pé para a praia, as tais garotas e os rapazes.
Eu simplesmente chego na garota proeminente e digo que então vou embora.
Isso é recebido sem reação nenhuma, como se fosse algo esperado.
Nem chego a me despedir, apenas anuncio.
Estamos nesse momento em vias de cruzar uma avenida, parece um esquema como havia em Maresias, no qual havia uma avenida principal antes de chegar na praia.
Ali passa muito táxi.
Minha idéia é pegar um e ir para casa.
Estou ali decidida. O grupo, que nem parou, continua seguindo em frente.
E nesse momento coisas começam a passar pela minha cabeça.
E foi esse momento que deixou uma sensação muito forte, que não entendo.
Bom, tá, até posso ver uma ligação lógica e racional, mas há uma sensação que persiste, como se tivesse algo mais.
Porquê a verdade é que eu não estava gostando de ficar ali com aquele grupo, mas ir embora não chegava a ser solução.
Eu não tinha para onde ir.
Havia uma sensação vaga de que eu estava indo para a casa da minha mãe, o que seria no mínimo tão ruim quanto ficar naquele grupo.
Não tenho certeza se não estou agindo por raiva. Simplesmente “chutando o balde” e largando aquele grupo que com certeza se achava “ininlargável”.
Mesmo sabendo que ninguém iria dar nem tchum para isso, eu sabia que a idéia de que alguém tão inferior não quisesse estar com eles iria atingir, mesmo que de uma forma mínima.
Não que isso pareça estar acontecendo. Ao mesmo tempo que penso essas coisas todas, vejo dois rapazes, os últimos do grupo, lá adiante, onde a trilha fazia uma quebrada a esquerda e se escondia atrás da vegetação,me fazendo um aceno preguiçoso, que transmitia de forma muito clara que a minha partida era mais como um incômodo, porquê eles não poderiam me ignorar totalmente,como gostariam, e eram obrigados a reagir de forma sociável e aquele aceno mole cumpria essa função e mesmo isso já era muito acima do que eles no fundo eles se sentiam motivados a fazer.
Mas vejo que aquele aceno de longe, de dois caras do grupo, fica ali como cumprindo a função do grupo todo em relação a mim.
Eu mesma estou bastante confusa e penso coisas contraditórias o tempo todo.
Ao mesmo tempo que vejo isso que descrevi, fico numa séria dúvida se não deveria ter me despedido do grupo.
Me parece uma falta minha. Uma ofensa. Porquê isso, se era tão explícito o quanto ninguém estava nem aí para mim? Mas um raciocínio se completa e quase me convence de que eu deveria ter me despedido deles.
Tem uma garota em especial, de quem eu quase gosto, que estava na praia, pelo menos dela eu queria ter me despedido.
Fico repensando meus planos, devo voltar atrás?
Os táxis passam. Me ocorre também o custo desse trajeto.
Estou num lugar que não se configura como SFX, mas é longe. Tipo um ligar no qual a corrida até em casa ficaria bem mais que 100 reais. Mas tudo bem, tenho como.
E mais pensamentos me vem no sentido se estarei fazendo a coisa certa.
No meio dessa confusão toda, pelo menos existe um sincero desejo de fazer o que é melhor para mim e realmente tentar me levar para uma situação melhor, mas é justo isso que não sei se estou fazendo.
Estou me levando para uma situação melhor? penso.
Porquê não fico aqui, desencano do grupo e pelo menos vou na praia.
Queria ir na praia.
Os dois rapazes já sumiram de vista, provavelmente aliviados de não terem mais obrigações sociais comigo. Estou sozinha ali na rua.
Passou um táxi e eu não chamei.Passou outro mas tinha passageiro.
Continua sendo muito fácil ir embora, tudo que tenho a fazer é esticar o braço.
Mas ainda não tomo essa decisão.