CONSEGUINDO SAIR DO PARQUE DE DIVERSÕES DO MAL

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Esse com certeza foi um dos sonhos mais impressionantes desde muito tempo. E nem tanto pelo que acontece, mas por expressar e representar de uma forma explícita e dramática exatamente como venho me sentindo faz bastante tempo, em relação à minha vida.

Estou num lugar que não me lembro como foi que cheguei ali.

O que eu lembro é que era um lugar de diversão, uma espécie de restaurante meio diferente, com jardins, como por exemplo o Santa Cecília, ou aquele Velhão, que fui com a Pat. O Velhão, apesar de no sonho não ser uma evocação do Velhão, o Velhão é mais o estilo, porque é um lugar que tem umas casas, umas ruas, umas coisas que não são restaurante e uma área que é restaurante. O que lembro também é que por fora ele não parecia tão grande. Mas de aparência lembra um clube com gramados. Cheguei ali com amigos e família e fui visitando o lugar, despreocupadamente e o sonho realmente começa quando começo a me dar conta de duas coisas: primeiro, que aquele lugar está me atormentando, E segundo, que ele é imenso e eu estou cada vez mais perdida nele.

Isso dele estar me atormentando é meio confuso de explicar, principalmente por que me dá uma agonia muito grande, pois como disse, é assim que eu me sinto em relação a minha vida e é assustador perceber isso, porque se a essa altura do campeonato me sinto assim, que me resta?

Mas vou me esforçar para exprimir, porquê isso, por mais que doa, ajuda.

Eu começo a perceber que aquilo que deveria ser divertido, na verdade é uma série de acontecimentos que apesar de terem um verniz atraente, na verdade se revelam cansativos, desgastantes, e pior, infrutíferos. É complicado descrever porque como o sonho logo de cara foi visto como uma metáfora da minha vida, tendo a descrever minha vida ao invés de descrever o sonho. Por exemplo, infrutífera é algo em relação a minha vida, mas no sonho, não ocorre nada que mereça essa palavra, isso já é interpretação minha e não quero interpretar. Vou tentar relatar bem o sonho mesmo.

Vamos indo de lugar a lugar desse “ parque”, na falta de um nome melhor, à espera que algum deles renda momentos de diversão, mas o ocorre na verdade é que cada um desses lugares, atraentes a princípio, acaba se revelando um lugar desagradável, às vezes até perigoso, e, o que mais importa, acaba se revelando um lugar de onde se quer sair rapidamente, só que isso nunca é possível. Isso é o que torna tudo mais desgastante. Cada lugar que se entra acaba virando, por vários motivos, um lugar muito difícil de sair, que exige muito tempo e muito, muito esforço. E tem mais uma coisa que é bem do sonho mesmo, apesar de refletir minha vida real: cada lugar que se entra acontecem coisas chatas que se desdobram em outras coisas chatas, então não são só os lugares que são difíceis de sair, mesmo quando se sai, se tem que resolver várias situações e problemas que foram criados por se ter estado naquele lugar, e assim, o que deveria ser um lugar divertido, esse parque, vai se transformando num emaranhado de coisas da qual a pessoa precisa se livrar antes de chegar na parte boa, que não chega nunca.

Isso que eu descrevi, apesar de poder dizer o mesmo da minha vida real, não estou forçando uma explicação, transparece no sonho claramente. No primeiro momento, talvez não tão claramente, na verdade pelo contrário. No primeiro momento, estamos todos sob a impressão de que aquele é um lugar divertido, então custamos a perceber que na verdade não estamos nos divertindo. A palavra diversão é tola e parece superficial. No sonho ela se aplica, porque aquele lugar é um lugar onde se vai para “ se divertir” mesmo, um parque. Mas no sonho, essa diversão que buscamos evoca algo mais profundo, evoca realização, evoca encontrar algo que seja bom de verdade ali dentro, algo que preencha a expectativa com a qual entramos, algo gratificante e isso é exatamente o que NUNCA acontece. Essa expectativa não é preenchida, sempre tem uma justificativa, o lugar legal é sempre o que vamos entrar depois, temos que resolver algumas coisas antes de poder chegar nele e o lugar que nos encontramos no momento sempre se revela meio decepcionante e o mais problemático, se revela difícil de sair. Mas vou explicar mais concretamente.

No primeiro momento, como disse, essa falta de diversão, ou antes, essa sensação de que a diversão está sempre sendo adiada, até surgir uma suspeita de que nunca irá ocorrer, está mascarada pelo fato de que estamos tão crentes que aquele é um lugar bacana, que demoramos a nos dar conta de que nada de bacana nunca acontece, pelo contrário.

Nesse primeiro momento essa sensação de mal estar é nítida, mas eu vou tomando consciência dela aos poucos e essa parte do sonho não tem acontecimentos nítidos, apenas a sensação é nítida, mas quando ela se torna nítida, quando eu penso claramente que tem algo errado e que esse lugar, ao contrário do que seria de se esperar, na verdade é ruim, então o sonho mostra elementos mais claros. Estamos numa casa de uma mulher já há bastante tempo, tentamos sair, mas mais uma vez somos conduzidas de volta a ela, por motivo nenhum, apenas porque a mulher é hospitaleira e insiste que a gente fique lá de um tal jeito que ninguém consegue se opor. Isso já é uma imagem bem nítida disso que estou querendo dizer, da “ falsa coisa boa”: a mulher aparentemente é hospitaleira e bondosa, mas na realidade o que ela faz é nos manter num lugar onde detestamos estar. Estou escrevendo tudo no coletivo, nós, nós, porque nesse primeiro momento do sonho é muito forte essa coisa de “ grupo” . Eu faço parte de um grupo e funciono de forma coletiva, o que eles pensam, eu penso. Como eles percebem as coisas, eu percebo.

Descemos uma escada em espiral, de volta para dentro da casa dessa mulher “ hospitaleira”.

A casa fica afundada no chão, como aquele restaurante que eu fui com o Ivã, onde se descia uma escada do nível da rua para se entrar. ( já vi umas casas com escadas que descem do nível da rua para entrar, na Rua dos Ingleses tinha, aquilo sempre me causava uma fascinação meio mórbida, uma casa afundada no chão. E nesse sonho esse elemento do “ afundado no chão” surge várias vezes).

E nesse ponto o sonho vai tomando formas bem explícitas dessa contradição entre aparentemente bom que na verdade é ruim: a escada é cercada por um arbusto florido com flores redondas, coloridas, num primeiro momento muito bonitas, mas elas se revelam flores carnívoras, que nos abocanham como bichos. Fico assustada e cubro meu rosto para me proteger. A dona da casa se aproxima de mim toda prestimosa e protetora, afastando as flores de mim como podia, para liberar minha passagem e me ajudando a descer os últimos degraus. Mas aí que está, a bondade e proteção dela era para me proteger de plantas carnívoras que ela tinha bem na entrada da sua casa, onde passavam pessoas. Que espécie de pessoa realmente legal tem plantas carnívoras bem ali onde podem abocanhar quem passa? E mais adiante a situação vai ficando menos e menos ambígua.

Uma outra mulher que parece que morava junto com essa primeira, me leva para o quarto onde vou dormir. Eu não queria nem ter voltado para essa casa, que já estava me incomodando bastante, agora vou ter que dormir ali, apenas porque se criou uma situação onde ficaria “ chato” recusar.

Essa segunda mulher, também com ares de super hospitaleira e “querendo agradar”, me mostra minha cama, toda arrumada, mas detalhe: o quarto está cheio dessas mesmas flores coloridas, que além de serem plantas, são bichinhos de estimação. Não é que são plantas e animais ao mesmo tempo, mas sim que ali naquela casa tem dois tipos de seres vivos com a mesma forma de coisa redonda e colorida, uns são as plantas carnívoras da entrada, e outros são esses animais de estimação que as duas mulheres tem na casa e que tem, como as flores, o tamanho de laranjas bem grandes, são coloridos, de cores bem atraentes, como rosa, amarelo, azul, como pompons mesmo, não se vê nem olhos nem boca nem nada, só esse exterior peludo colorido e atraente, quase meigo no caso desses bichos, só que... eles pulam como pulgas, e assim como as flores, mordem. Sim, os bichos mordem, com a vantagem de que não estão presos na terra, podem vir perseguindo você.

O quarto está infestado deles, até acho que esse quarto que foi preparado para mim é como se fosse o quarto onde esses bichos dormem, e a mulher ainda se vira e me diz que eu tenho que dormir com eles na minha cama!!!!!!!!!!!!!!!

– Como assim? pergunto indignada.– Eles vão ficar me mordendo o tempo todo.

– Ah, você se acostuma, você se acostuma, diz a mulher, num tom de “ deixa de ser tão encrenqueira”.

É nesse momento que o sonho “ rompe” com aquela ambigüidade se “ será que isso é uma coisa boa?” deveria ser boa., então porque não me parece boa? será que estou enganada?”

Não estou enganada, não é boa mesmo! A mulher hospitaleira delicadamente, educadamente, simpaticamente me força a dormir numa cama rodeada por uns 50 desses pompons fofinhos que mordem!!!!! Quer que eu me acostume com isso. Já estava bem sinistro ela achar normal que eles ficassem pela casa perseguindo e mordendo os convidados, mas agora ela quer que o convidado durma na cama com eles. Não, isso não é bom, de jeito nenhum.

– EU NÃO QUERO! eu grito. E depois repito várias vezes Eu não quero, eu não quero dormir na mesma cama que eles!

Esse grito, apesar de totalmente inútil, porque a mulher não liga e me deixa ali sozinha, depois de deixar bem claro, sempre educadamente, que não existe outro lugar na casa onde eu possa dormir e eu penso, que farei, estou exausta, não vou agüentar ficar sem dormir, mesmo assim esse grito é um momento de liberação, porque eu assumo uma posição contra tudo aquilo que estava acontecendo, assumo que eu não quero.

Antes estava uma confusão, eu ia meio que agüentando tudo porque teoricamente aquilo deveria estar sendo bom. E nesse momento ouso me rebelar e contrariar a “ autoridade” daquele lugar, que queria que eu me acostumasse a ser mordida o tempo todo.

E a partir daí fica claro uma coisa para mim: aquele não é um lugar de diversão, é um lugar ruim, e meu único objetivo passa a ser ir embora.

Antes a gente estava sempre tentando chegar na parte realmente divertida. A partir daí eu vou suspeitando de uma maneira crescente que não existe parte realmente boa e divertida.

A coisas começavam a ficar mais interessantes e atraentes em algum momento, mas acabavam desembocando em situações desagradáveis ou exaustivas, ou numa palavra, frustrantes.

Estou ficando deprimida em relatar esse sonho, mas vamos em frente.

Eu saio dessa casa e com muito, muito esforço começo a atravessar o lugar, tentando achar a porta de saída. O chão é de uma grama difícil de andar, o pé afunda, como se o terreno fosse mole, olho ao redor, não enxergo o limite do lugar, que parece imenso, não faço idéia de onde esteja, estou perdida, cansada, e nem sei se estou andando na direção certa. 

Aí acontece uma coisa que representa bem isso que eu quis dizer, de coisas chatas que se desdobram em mais coisas chatas que vão consumindo cada vez mais tempo e energia e adiando cada vez mais a parte boa.

Quando estou meio exausta de andar nesse gramado íngreme (sempre é subida) que afunda, debaixo do sol, encontro um grupo de amigos. Depois que tinha saído da casa das criaturas que mordiam me separei do grupo. Agora, encontro amigos, mas não sou mais a mesma pessoa de antes, que pensa e reage em conjunto.

Encontro esses amigos que gosto e por um instante, fica até legal, ainda quero sair dali, mas pelo menos estou com meus amigos e finalmente, fazendo algo realmente divertido, quando...

Sim, quando um dos meus amigos vem todo nervoso me dizer:

– Depredaram seu carro! Vem ver!

Demoro uns instantes para entender que tinha deixado meu carro no estacionamento e algo tinha acontecido. Não chego a acreditar que tenha sido algo tão terrível quanto meu amigo diz, imagino que ele esteja mais usando força de expressão ao dizer que ele tinha sido depredado, mas ao chegar no estacionamento, onde vou com ele, é pior do que pensava. Depredado é pouco, eles retiraram praticamente tudo do carro, deixando só uma carcaça aberta que não serve para nada.

Fico sem reação. Meu amigo diz que quem fez isso foi um playboyzinho entediado, de pura farra, para impressionar seu grupo de amigos. Sei de quem se trata. Fico furiosa e tomada por um desejo absoluto de processar esse FDP e fazê-lo pagar pelo que ele fez. Abandono meus planos de sair dali e vou a procura desse cara, quero chegar nele e fazer com que me diga seu nome completo, CIC e RG, que seriam dados suficientes para abrir um processo contra ele. Vou andando prevendo o desenrolar disso tudo, o processo, o trabalho que terei para fazer justiça, já que ele é mais rico e com mais condições de se defender, que advogado devo procurar, quanto irá cobrar, etc.

E, mesmo tomada por um profundo desejo de fazer justiça, me vem um mudo desespero de prever o quanto, o quanto esse processo irá consumir de minhas forças e o quanto vai me manter presa naquele lugar, de onde sinto que devo sair enquanto ainda justamente tenho forças para isso. E mais uma vez, surgia diante de mim uma razão “ certa” para não sair, porque eu tinha sido lesada e deveria tentar fazer justiça.

E quando estou remoendo esse impasse, estou perto de uma espécie de uma fonte, com um lago artificial, onde a superfície da água está coberta de lindas flores, algo muito atraente mesmo. Do outro lado da fonte está uma figura masculina que me diz algo que me passa a impressão de que ele quer me ajudar e me guiar, ele diz: vem até aqui!

Dou a volta nessa fonte, para chegar até ele, e ele me diz:

– Ah, mas eu queria que vc tivesse passado pelo meio da fonte!

E passa para me mostrar e eu vejo que a fonte na verdade é um pântano, se eu tivesse passado por ali, teria ficado presa no lodo, não ia afundar totalmente, mas ia ser muito custoso e trabalhoso sair dali e isso super simboliza aquele lugar, isso que eu quero dizer de que a parte boa é só um chamariz, que nunca se concretiza, pior, é um chamariz que te mete em mais problemas.

Estou cada vez mais triste de estar escrevendo isso, mas não vou fazer comentários pessoais no momento, vou me ater ao sonho, e deixar que ele fale por si.

Fico meio espantada desse comentário desse homem, em quem eu estava vendo alguém bem intencionado. Então a intenção dele é que eu ficasse presa no lodo?

Mas pelo jeito estou mais esperta e não me deixo enganar por flores.

Não sei porquê, a descoberta de que estava de certa forma muito certa sobre o aspecto maligno e enganoso daquele lugar, a gente acha que vai ficar perto de lindas flores e acaba atolada num lodo, isso me liberta de vez de um sentimento de que eu “ deveria” ficar ali para mover um processo contra o idiota que depredou meu carro. Desencano de vez disso.

Em grande parte seria para que não pensassem que podem me fazer de trouxa, ou seja, uma preocupação com minha imagem.

Vou até essa figura masculina do outro lado da fonte e sou bem direta, e aí, onde fica a saída? É isso que me interessa.

Acho que é esse mesmo homem que se transforma em outro, mais baixinho, com uma cara meio branca e pastosa que me lembra um ator do grupo judeu de teatro da Hebraica e que me olha com um sorriso muito ambíguo. Vamos andando, eu indo atrás dele e lhe digo:

– Olha só, tem duas possibilidades. Ou você é legal, ou você não é legal. E logo logo, as coisas que você fizer vão me revelar quem vc é.

Ele me olha meio balançado, e vejo que o que ele gostaria é justamente de se manter meio ambíguo, me manter na dúvida. Esse era o prazer dele, aquele “jogo”. De forma geral, as pessoas que estão nesse lugar se ocupam com “ jogos”, como esse, de manter a outra pessoa na dúvida, brincar com as expectativas dela, etc.

Logo estou sem esse cara, que pelo jeito não pretendia me ajudar, apenas estava brincando com minha expectativa a esse respeito. Acho que é então que encontro minha família.

Estou escrevendo esse sonho há praticamente duas horas, mas eu acho que ele merece, que é importante. 

Nesse momento que encontro minha família, tenho um momento de paz, no qual sinto que encontrei algo sólido, real. Vou com eles para o restaurante, almoçar, até me esqueço da minha intenção de sair dali.

Estou sentada na mesa com eles, comendo, até feliz, quando, num comentário, minha irmã me revela que tinha me pagado metade da verba que tinha recebido para contratar funcionários. Foi assim: minha irmã tinha sido contratada por esse lugar para fazer algo de trabalho. Mas ela tinha preferido passar o trabalho para mim, que tinha mais a ver comigo, como se tivesse sido uma indicação mesmo que ela tivesse feito de mim para os clientes.

Só que ali naquele momento descubro que não foi nada disso, na verdade ela embolsou a maior parte da grana e me pagou uma mixaria para que eu fizesse o trabalho.

No mundo dos negócios isso é prática comum, afinal eu tinha aceito o valor, o que pesava ali era que ela era minha irmã, e que tinha se dado bem as custas de me explorar.

Fico muito atingida com aquilo, me sinto traída, usada. Meu pai está dizendo algo que ninguém escuta, e minha mãe, que está a minha esquerda, começa a falar algo no sentido de que talvez isso não tivesse sido a coisa mais certa do mundo, mas...

Ou seja, percebendo que tinha sido algo errado, mas tentando amenizar.

Fico muito muito brava e de novo, assim como a mulher da cama dos bichos, me imponho.

Grito para a minha mãe, mas sem ódio, apenas firmeza:

– Fica quieta. Isso é errado, não tem a menor dúvida. Ela me enganou, disse que só tinha uma tal verba para me pagar, e isso era mentira, ela tinha uma verba muito maior, que ela embolsou. Ela é minha irmã e me enganou para que eu aceitasse fazer o trabalho por menos, e isso é errado e ponto final!

Por que a minha mãe já estava naquele mesma atitude da mulher da cama dos bichos, de tentar fazer uma coisa errada e abusiva parecer “ normal”.

No que digo isso, sou tão firme e estou tão clara no que acho, que todos se calam. Eu me levanto e rompo com minha família. Pessoas que me enganam, que me usam, que me traem. Pessoas que não merecem minha confiança.

O lado bom é que com eles, pude chegar a esse restaurante, que fica na área que conheço bem do parque, onde sei me localizar, e dessa vez, sei exatamente como chegar na saída.

Saio, decidida a não deixar que nada, nada, nada me detenha.

Sigo por uma rua de paralelepípedos com casinhas ao redor, nesse momento o lugar evoca um lugar da vida real: aquele centro onde ocorreu o Festival de Toulouse.

Vou andando, dessa vez com o objetivo de sair e duas imagens muito impressionantes estão no caminho:

Primeiro, no meio da rua, entre os paralelepípedos, se encontra afundada no chão (afundados, sempre, o nome do sonho deveria ser Afundados) uma mulher extremamente, morbidamente obesa, como aquela daquele filme desagradável que eu parei de assistir.

O mais impressionante é que é como se a mulher tivesse se afundado no chão por causa do seu peso, e depois disso tivessse se afundado na própria gordura. E o mais impressionante de tudo é que ela está rindo e dizendo coisas divertidas, então aquilo meio que passa por uma coisa engraçada. Mas não é, é horrível. Percebo que existe o risco daquilo me prender, ou de eu afundar na gordura da mulher, se passasse muito perto dela, ou de ficar prestando atenção nas coisas engraçadas que ela diz, então procuro me manter firme em chegar na saída. E logo depois dessa mulher, há outra figura tão impressionante quanto. 

A uns 7 metros dessa mulher obesa, na calçada a minha direita, está uma outra mulher, deitada dentro da calçada, sim, não sobre a calçada, mas afundada nela, como se tivessem cimentado seu corpo no pavimento. Está, como a obesa, apenas com a cabeça solta do chão, o resto do seu corpo, apesar de visível debaixo de uma camada mais fina de concreto, está isso mesmo, concretado no chão.

Céus, o que pode ser mais desesperador que isso?

E, assim como uma vez sonhei com dois mendigos enterrados no chão em covas, mas que mesmo assim ficavam fazendo graça um com o outro, essa mulher cimentada e a obesa era amigas e ficavam trocando comentários engraçados.

– Amiga, vem até aqui para a gente papear! dizia a cimentada, e continuava: – Não, deixa que eu vou até aí.

Brincando com a própria desgraça de não conseguirem, nenhuma das duas, sair do lugar.

Essa imagem simplesmente horripilante, bem na via principal de entrada do lugar, era o mais agudo símbolo da malignidade daquele lugar e o quanto distorcia as pessoas, fazendo parecer engraçado, até para as próprias vitimas, o fato de estarem presas ali para sempre.

No sonho não me veio esse pensamento, mas agora me ocorreu que era assim que esse lugar agia, desgastando as pessoas até que elas não conseguissem mais se mover e afundassem no lugar, se tornando parte dele.

Por sorte não fico tão abalada quanto fiquei agora, escrevendo. Apenas me dou conta de que corro o risco de ficar ali observando a cena e com isso me delongando ali e me forço a passar reto, sem me distrair com nenhuma das duas mulheres e então....

Adiante de mim está o portão de entrada de duas folhas altas de madeira, entreaberto.

Vou na direção dele. Logo antes, tem uma espécie de mureta baixa esquisita, que atravanca mas não impede a passagem, tudo que tenho a fazer é pular aquilo e é o que faço, e empurro o portão já entreaberto e ganho a rua.

Estou livre, estou livre, penso.

Na rua, tem um cara com dentes enormes perseguindo uma pessoa.

Mais coisas perigosas, penso. Mas não importa. Estou livre e nunca mais vou voltar lá.

{11 de fevereiro de 2014}

IMAGE CREDITS ERWIN OLAF

Bem.

Terrível como uma narrativa do apocalipse. O que tem de bom: eu realmente saio.

Muitas vezes o sonho se desvanece pouco antes de eu sair e eu, meio acordada, meio dormindo, meio que forço uma imaginação de que estou saindo, para não acabar nessas cena frustrada. Mas nesse sonho não. Eu realmente saio. E quando eu sonho que estou saindo de um lugar, como sonhei, por exemplo, que estava saindo de um lugar onde estava com o André Sturm, e sonhei que estava saindo de Tiradentes, eu realmente saí da situação ruim na vida real. Então isso me dá um alento.

CONSEGUINDO SAIR DO PARQUE DE DIVERSÕES DO MAL

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