{9 de setembro de 2017}
Chego com minha família num lugar que lembra mais o Rio do que São Paulo.
É onde moramos. Vejo com nitidez perfeita a esquina onde há nosso prédio, eu que nunca morei em prédio com minha família, e a esquerda uma praça funda com vegetações.
Já dentro do carro eu decido, depois de pensar bastante, que vou fazer o que me parece o certo: ao invés de ir para casa, vou pegar a bolsa mandala da minha tia que eu havia deixado no fundo da praça, em meio a umas trepadeiras floridas que lembram aquela flor que tinha na Gregório, esqueci o nome, só que lilás. Lilás de novo. Como as flores que tinham no sonho do
O SONHO PERDIDO DA MÃE DA ADRIANA
Toda a parede é por dentro como é por fora, um ripado meio rústico num tom rosa caipira.
E aqui é que gostaria de lembrar melhor. O que recordo é de maços de flores secas dependuradas de cabeça para baixo sobre o que seria a parede dos fundos e essa parede não tinha janelas nem aberturas, só a da frente tinha.
Agora escrevendo lembro de um maço de flores secas que eu tive muito tempo quando tinha uns 14 anos anos, que era de umas flores roxinhas. Não sei onde consegui aquilo mas guardei muito tempo e acabei jogando fora.
Mas no sonho acho que as flores eram brancas.
Na verdade as flores eram brancas e as flores que tive em criança roxas, mas as flores parecidas que comprei no pão de açúcar são lilás e sinto que as flores desse sonho são o mesmo elemento sinalizando.
Pois eu havia deixado a bolsa mandala, que no sonho não chego a lembrar que é a da minha tia, coisa que tornaria ainda mais imprescindível que eu fosse recuperá-la, na praça, no fundo, dependurada no meio da trepadeira com as flores em volta.
Poderia até deixar lá, mas assim como decido lavar a louça antes de dormir ao invés de deixar para o dia seguinte, decido ir pegar a bolsa.
– Além disso podem roubá-la, penso.
Mas nem é esse o motivo principal, é mais algo de disciplina mesmo.
Vou até o fundo da praça mas chegando lá não encontro a bolsa, só as flores.
Fico muito confusa. Me parece que se fiz a coisa certa, deveria ser recompensada.
E então levo algo nas mãos meio precioso para mim.
Aqui fica confuso.
Estou acompanhando uma japonesa que acredito que seja minha parceira.
Nossa, aqui escrevendo me veio muito espontaneamente, a garota dos tops.
Ela está num pequeno carro e eu num outro ao lado, como um kart. Estou conversando com ela e parece que estamos indo juntas para um lugar.
Então ela sai do carro dela para uma espécie de mini carro de uma roda só.
Apesar de estar falando comigo, reparo que ela não me olha e está muito séria.
Então no cruzamento, onde eu teria que virar a direita. ela sem me olhar nem me dizer nada, segue reto.
Percebo então que ela não era minha parceira.
Acho que tem a ver com a garota dos tops sim.
Nada mais me resta a não ser seguir sozinha e como meu caminho é virar a direita,é o que faço.
Mas a chuva molhou o que eu carregava a ponto de inutilizá-lo.
É noite e acho que então resolvo ir para minha casa.
Esse trecho está meio turvo.
Sei o caminho, sei onde estou.
Estou no meu quarteirão, onde fica o Copan, que é onde moro.
Aqui tem algo super sutil.
Acredito que moro no Copan, o sonho não coloca nenhuma objeção a isso, como em sonhos que claramente me mostram convencida de coisas que não são verdade.
Então seria como um sonho no qual minha realidade é que moro no Copan...99%. Tem 1% de algo que não fecha 100% nisso. Simplesmente não sei dizer o que seria. Só sei que tem algo aí, algo nisso de eu acreditar que moro no Copan.
O que acontece é que de dentro desse pequeno veículo onde estou, que é quase como se estivesse a pé, de tão aberto, baixo e lento que ele é, vou olhando a sequência de edifícios a minha direita, que nada tem a ver com a vida real e o prédio que deveria ser o Copan não é.
Se não me engano no lugar que deveria ter o Copan há uma garagem subterrrânea.
Algo nisso não me supreende. Não sei dizer o que seria também.
Só sei que fico apenas 99% supresa.
Acho que pergunto algo para os funcionários da garagem, mas eles não sabem de nada. Nesse momento estou a pé na calçada, acho que carrego a coisa danificada mesmo que esteja danificada.
Está de noite.
O que me passa na cabeça é assim, vou relatar em minúcia para ver se enxergo algo nesse misterioso sonho.
Ah, tá, antes um detalhe. Na vida real ontem fiquei pensando naquele texto que escrevi,que veio de um sonho, sobre eu procurando minha casa mas não lembrava onde era. Em determinado ponto eu pensava:devem ter mudado a casa de lugar.
Aqui não há dúvida de que o Copan era ali mesmo.
Mas foi mudado de lugar.
Tudo foi feito enquanto eu estava fora.
Mas como fazem isso e não avisam os moradores?
É isso que penso.
O resto não questiono.
Fico pensando no que fazer.
A pior opção é sair andando por aí a pé procurando o Copan.
Penso em ir passar a noite no meu outro apartamento o da Padre Carvalho, que no sonho é um prédio meio azul no mesmo quarteirão, do qual tenho a chave. Mas curiosamente não quero. Vejo que não quero e então procuro um motivo.
Ah, está vazio e não tem cobertores, vou passar frio.
Mas a verdade é que não quero.
Seria a coisa mais sensata a se fazer, o prédio está no lugar de sempre, bem perto de mim. Mas não quero.
Então penso que motoristas de táxi devem saber onde colocaram o Copan e a melhor maneira de encontrar é pegar um táxi.
Começo a olhar os táxis encostados na rua mas a maioria está sem motorista.
Vou andando e então passo por um táxi que parece uma mini van meio inglesa. É branco e dentro tem uma mulher e o motorista, que está sentado dentro dessa van que lembra os carros ingleses antigos, diante de uma mesinha comendo um sanduíche.
Mas a mulher, que parece uma espécie de agenciadora, logo nota minha cara óbvia de pessoa procurando táxi e já se mostra toda receptiva.
Pergunto:
– Esse motorista é daqui?
Não lembro direito a sequência.
Mas logo de cara noto algo que me leva a ter dúvida se o motorista era de SP e se ele não fosse, não saberia do Copan.
A mulher diz que sim, ele é sim.
Mas o motorista, de dentro do carro, se vira para mim com seu sanduíche estilo baguete na mão e fala comigo em francês.
A mulher, claramente desmentida, continua sorrindo meio amarelo para mim, mas é de se esperar que ela minta.
Não fico brava. Apenas digo que não serve e sigo caminho.
Essa cena, com esse táxi pequeno, com essa mini salinha dentro, teve um clima muito iluminado. Ele brilhava ali no meio daquela noite úmida.
São estranhos esses elementos que tem uma força muito grande mas parecem não ter importância no sonho.
O táxi era atraente, algo atraente, mas não me servia.
Agora escrevendo me ocorre que deveria ter abandonado meu plano e pegado esse táxi mesmo assim. Onde me levaria esse motorista francês meio enganador?Mas no sonho continuo racional e focada no meu raciocínio de que apenas um motorista ali da região seria capaz de me levar no Copan.
Então depois de passar por mais táxis sem motoristas, vejo longe um carro meio velho, tipo um Chevette, acho que meio azul claro até, que tem aquela plaquinha de táxi no capô.
Um táxi bem capenga, mas táxi. Está estacionado deixando passageiro.
Corro até ele.
Pergunto se está livre e o motorista faz que sim.
Logo que me aproximo dele sei que esse motorista, que é um rapaz moreno jovem e desmazelado, teve uma grande decepção amorosa, se não me engano com a passageira que está deixando o táxi.
Não é nada de muito sobrenatural eu saber disso.
Esse motorista está dizendo coisas de namorado largado para a figura indistinta que desce do carro.
Não penso nada de pessoal a respeito,estou aliviada por finalmente encontrar um táxi a agora acho que vai dar tudo certo.
Falo para ele:
– Me leve até o Copan.
Toda vez que vou escrever Copan aqui tenho a inclinação de escrever com m.Copam.
Mas seguindo.
O rapaz não objeta nada, ou seja, ele sabe onde é o Copan.
Não deve ser longe, não iriam tirar o Copan do Centro.
Então fico pensando nas possíveis falhas do meu raciocínio.
O Copam tinha um hotel na frente e mais atrás ficava a ala dos apartamentos.(nossa, agora me distraí e escrevi com m)
Quase como se fosse dois prédios em um.
E se tivessem mudado só a parte do hotel?
Eles não avisaram nada, pode ser que tenham dividido o prédio, feito outros arranjos que não estou sabendo.
Logo ficarei sabendo, penso, pois o motorista encosta no prédio.
Por fora é bem o Copan mesmo, quero dizer, o Copan como era no sonho, um prédio mais estreito que o Copan real, mas com a fachada ondulada.
Nesse pedaço final, o que fica em destaque não é o Copan e sim a atitude do motorista.
Ele está falando comigo, demonstrando interesse até.
Mas devido ao seu passado infeliz, seu comportamento está meio desiquilibrado.
Num tom divertido no qual transparece seu desespero, ele me fala das suas qualidades.
– Sou jocoso, gostoso, etc, etc.
Não eram exatamente essas as palavras. Lembro que ele dizia coisa curtas e que sua capacidade sexual era mencionada, mas tudo era exagerado e carregado de desespero.
No que estou de pé na calçada pagando ele estica seu pé descalço pela janela e me cutuca de um jeito chato.
Mesmo tomada pelo problema da minha casa sumida que talvez nem seja ali onde estou, mesmo incomodada com a atitude dele, consigo perceber que é superficial.
Ele é um rapaz atraente até e está agindo assim por puro desespero.
Digo:
– Olha, não faz assim.
E sei que serei entendida por ele.
Mas estamos nos separando ali e não sei como fica a questão da minha casa.
O que pensar disso meu deus.
Esse motorista de táxi poderia ser uma versão do Norberto?
Não gostei desse Norberto.
Mas acordada, o que me veio era que o sonho era sobre eu dando um volta gigantesca para chegar no lugar onde eu acreditava que morava, mas não morava lá.
IMAGE CREDITS ARTHUR ELGORT | KARLIE KLOSS | VOGUE NIPPON SEPTEMBER 2011