A CASA ONDE MINHA MÃE ESTAVA

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Seria um procedimento rotineiro meu. Não diário, mas ali no sonho está a lembrança recente da vez anterior, coisa de dias, na qual eu havia realizado exatamente a mesma sequência.

Eu chamava um táxi ali nas imediações da Vila Mariana, ou num lugar não identificado, pois justamente dizia ao motorista:

– Me leve até o começo da Vila Mariana e dali vemos a melhor rota para chegar na casa da minha mãe.

Nessa segunda vez que faço isso, e é um motorista japonês, eu ainda detalho:

- Ali no começo da Sena Madureira, virada sentido centro.

No sonho esse ponto da Sena Madureira se fundia com a lateral da parte dos fundos do Círculo Militar, ali virado para aquele monumento das Bandeiras, ou aquele prédio do Governo bonito que não sei o que é, que era chamado por mim de 23 de maio mas acho que nem era e que tinha um emaranhado de vias nas quais, em sonho, eu sempre me perdia e nunca conseguia chegar onde queria e acredito representarem os falsos circuitos energéticos distorcidos de dentro do ser que nunca dão em nada.

– De lá vemos qual é a melhor rota para…

Essa era uma frase que eu sempre repetia para o motorista nesse procedimento mas mal tenho tempo de terminá-la pois o motorista japonês, parecendo algo entre obtuso ou muito mais inteligente do que eu poderia imaginar, dá partida e sai numa bala na direção certa, o que me faz pensar que sim, ele entendeu.

Vai costurando e acelerando a ponto de eu me segurar no banco e pensar:

– Mas será que eu por estar com mais idade agora acho que os motoristas de táxi correm demais? Que nem minhas tias?

Mas logo chegamos ali no tal ponto de onde eu deveria, junto com ele, decidir qual caminho pegar para ir na casa da minha mãe e então fico confusa sobre onde seria. Seria a Otonis?

Essa parte do sonho diluiu bem e não lembro direito, só sei que não sei qual seria a casa da minha mãe e talvez diga Pinheiros, pois novamente o motorista sai numa bala e em instantes estou na tal casa.

Continua bem diluido.

Eu entro na casa, é uma casa térrea e faço algo lá e a parte que ficou seria assim:

Falo com minha mãe no telefone e ela vagamente se queixa de preocupação com dinheiro. E em seguida vem meu pai falar no telefone comigo e ele, daquele jeito dele, fala naquele tom de coitadinho que ele adotava para falar de dinheiro, que tinha ganho um dinheirão, 350 reais e iria gastar tudo.

Tudo é meio fingido, ele sabe que 350 não é nada, mas é aquela coisa coitadinha que ele gostava de incorporar, tinha uma história dele quando era criança e ficou doente e o médico veio e perguntou se ele queria algo e ele disse:

– Um pedaço de pão.

E nem foi tão pobre assim. Inclusive minha avó ficou furiosa.

Meu pai gostava de incorporar essa coisa miserável, eu notava isso, tipo os personagens do Charles Dickens órfãos coitados. Deus o abençoe. Eu te amo, Pai.

Mas eu fico irritada e aqui tenho um pensamento que deve conter a mensagem desse sonhos.

– Mas que droga. Minha mãe aflita e o que ela conta como provedor é meu pai que prefere ficar com esse teatro de pobrezinho. Ele é que deveria arrumar dinheiro para minha mãe e ao invés disso fica aí com essa farsa.

E nisso emenda que eu saio ali para a garagem da casa que em nada seria uma casa da vida acordada e tem um buraco e tem um móvel enorme e eu vejo que vou cair no buraco com o móvel por cima mas consigo, consigo escapar disso e não me machucar.

Iria me machucar feio, eu penso. Até mesmo no sonho eu acho que tem alguma relação disso de quase ter eu mesma me ferido com a raiva que sinto do meu pai.

E acho que nesse momento é que vem a linda e forte cena que deu nome ao sonho.

Ainda estou meio que tentando ir para a casa da minha mãe, que ao que tudo indica não seria essa, pois falei com ela por telefone.

E o que minha irmã vem me mostrar do meu lado esquerdo, por si só um indicativo de que ela vem como a voz da Coisa Boa, são uma sequência de fotos no celular dela que correm na vertical, uma sequência de fotos horizontais correndo em scrolling na tela e todas, todas as fotos seriam do escritório da casa, e seria essa a tal casa onde minha mãe estava e para a qual eu estaria indo, algo que até parecia o escritório da Lapa, mas o escritório da lapa nunca foi usado dessa forma.

Havia sofás e poltronas e ali estavam minha mãe, a Carina criança e eu e minha irmã e mais alguém, vendo TV juntos. As fotos seriam todas, todas elas desse mesmo momento familiar, mas em épocas ligeiramente diferentes e algumas tinham essa coloração avermelhada e desbotada de fotos antigas mas o que as fotos transmitiam nada tinha a ver com passagem do tempo e sim com o fato de todas elas mostrarem um ambiente feliz e amoroso e aconchegante. Uma família feliz, amorosa e aconchegante.

As fotos me perturbam, me dão aquela coisa que não entendo bem, um sentimento tão forte que incomoda e eu afasto o celular e digo que não quero olhar, pelo menos não no momento, pois tenho que resolverr algo muito importante que seria pagar o motorista japonês de táxi que me trouxe. Ele me levou até essa casa, a do quase acidente mas já estou na rota de ir para a casa da minha mãe mas não paguei o motorista. Deixei ele esperando e ele deve estar pensando que dei o cano e me achando desonesta e isso sim me mobiliza e eu saio correndo tentando localizá-lo para me redimir mas ele se foi, ele se foi. Mas no fundo, mesmo no sonho, percebo que era para as fotos sim que eu deveria dar atenção.

As fotos da casa onde minha mãe estava.

IMAGE CREDITS NOT MINE

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